quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

O Código da Vinci: Fato ou Ficção?

Código da Vince
por Maxine Bingham e Ron Bingham


O romance de Dan Brown, “O Código da Vinci”,1 vendeu mais de 40 milhões de exemplares e foi produzido com muito sucesso no cinema.2 A publicidade gerada por essa obra tem sido extraordinária. O Vaticano e o Arcebispo de Canterbury condenaram o romance,3 e o escritor Dan Brown foi, em vão, processado por crime de plágio pelos autores de obra de ficção semelhante, “O Santo Graal e a Linhagem Sagrada”4. A atenção massiva da mídia resultante disso nos faz refletir sobre três questões: Qual é o apelo do livro? Por que a reação tão forte a ele? Por que deveríamos nos importar com ele?


Síntese do Enredo


Para responder a essas questões, vejamos primeiramente o enredo do livro. Robert Langdon, um professor de “Simbologia”5 da Universidade de Harvard, é chamado pela polícia parisiense para resolver o estranho assassinato de Jacques Saunière, curador do Museu do Louvre. A ação se desenrola num período de 24 horas, iniciando-se com códigos misteriosos e símbolos escritos pelo homem assassinado. A narrativa focaliza, então, um homicida que pertence ao Opus Dei, movimento da Igreja Católica, que parece estar um passo adiante do herói Robert Langdon e da heroína Sophie Neveu, uma criptógrafa francesa, neta do curador assassinado. As aventuras de Robert e Sophie levam-nos a pedir o conselho do rico e misterioso Sir Leigh Teabing, um “especialista acadêmico” em história e relíquias cristãs, tais como o Santo Graal, pelo qual Teabing tinha total obsessão. Teabing revela aos perplexos Robert e Sophie alguns “fatos históricos” que, segundo ele, se fossem levados a público, destruiriam a fé dos cristãos, pois negavam a divindade de Cristo e a exatidão e historicidade das Escrituras. Teabing declara que o Vaticano eliminou o “divino feminino” através de quase dois mil anos de conspiração, o qual se iniciou com o Imperador Constantino, no quarto século d.C., e prosseguiu até hoje com os papas e o Vaticano.


O principal segredo revelado por Teabing é que o verdadeiro Santo Graal6 não foi o copo ou cálice de Jesus na Última Ceia, mas, na realidade, Maria Madalena que, como esposa de Jesus e mãe de Sua filha Sara, foi progenitora da linhagem de Jesus, da qual descenderam os reis merovíngios da França, e a pessoa a quem Jesus, como homem mortal, delegou a liderança de Sua igreja. Algumas pistas que indicam que Maria Madalena era o Santo Graal, estão disfarçadas em “A Última Ceia” e outras pinturas de Leonardo da Vinci, o “grande mestre” do Priorado de Sião, conforme catalogado em Les Dossiers Secrets, da Biblioteca Nacional da França.


A novela chega a um final dramático quando se descobre que foi Teabing o mentor dos assassinatos, e que Sophie é descendente de Maria Madalena e Jesus, e personificava o “verdadeiro” Santo Graal. O enredo finaliza com Robert Langdon que, esclarecido pelas revelações, faz uma dramática reverência aos ossos de Maria Madalena, sepultados secretamente sob a pirâmide de vidro7 projetada por I. M. Pei, na entrada do Louvre.


Qual é o Apelo Desse Fantástico Conto?


Primeiro, a novela é dinâmica e repleta de mistérios, com pistas, códigos e palavras intrigantes, assim como heróis e vilões e uma donzela aflita (Sophie). Segundo, o livro é baseado em teorias de conspiração, em polêmicas contra autoridades religiosas especialmente contrárias à Igreja Católica Romana, que foi recentemente alvo de escândalos. Terceiro, a obra menciona pessoas e eventos reais, desde o Imperador Constantino e o Concílio de Nicéia, em 325 d.C., a pintura de Leonardo da Vinci, “A Última Ceia,” que supostamente representa Maria Madalena e não o discípulo amado João, como um dos 12 discípulos (nesse caso, onde está a 13a pessoa?). Segundo Dan Brown, o Concílio de Nicéia “declarou oficialmente” a divindade de Jesus através de um “voto fechado”, numa disputa de poder patriarcal que determinou o cânon do Novo Testamento. Teabing afirma que até aquela época, os cristãos acreditavam que Jesus era um mero mortal e criam noutros evangelhos. Quarto, o livro atrai adeptos da Nova Era e algumas feministas que abandonaram o monoteísmo e formaram seu próprio paganismo romantizado, embasado numa religião e rituais do “divino feminino” e da “deusa”.


Por que os Cristãos Deveriam Dar Atenção a Isso?


Não apenas os não-cristãos são enganados, mas até alguns cristãos são influenciados pela natureza pseudo-acadêmica do livro. Dan Brown esforçou-se para apresentar sua novela como baseada em centenas de fatos que foram escondidos pela Igreja. O prólogo, por exemplo, inicia-se assim:


“FATO:
O Priorado de Sião, uma sociedade secreta européia fundada em 1099, é uma organização real.8 Em 1975, a Biblioteca Nacional de Paris9 descobriu pergaminhos conhecidos como Les Dossiers Secrets, identificando numerosos membros do Priorado de Sião, incluindo Sir Isaac Newton, Sandro Botticelli, Victor Hugo e Leonardo da Vinci. O movimento do Vaticano conhecido como Opus Dei é uma devotada seita católica, que foi o centro de recentes controvérsias devido a relatos de lavagem cerebral, coerção e prática perigosa conhecida como ‘mortificação corporal’. A Opus Dei completou recentemente a construção de sua sede nacional, localizada na Avenida Lexington, 243, em Nova Iorque.10 Todas as descrições de trabalhos de arte, arquitetura, documentos e rituais secretos nessa novela são corretas.” [o itálico é nosso]. Foram essas alegações que causaram protestos de cristãos de todas as denominações, assim como de jornalistas11 das principais mídias, e de respeitados teólogos e historiadores cristãos e seculares.12


Contestando as Alegações de “O Código da Vinci”


Literalmente, todo fato ou personagem mencionado nesse romance é adulterado, produto da imaginação do autor ou baseado em novelas anteriores que o personagem de Brown, Teabing, salienta como “best sellers internacionais”, inclusive “A Revelação dos Templários,” The Woman With the Alabaster Jar, The Goddess in the Gospels e “O Santo Graal e a Linhagem Sagrada”.13.


O outro lado de tudo isso é que organizações como a Opus Dei (um movimento católico, e não uma ramificação criminosa organizada do Vaticano, como descrita na novela),14 estão-se beneficiando da publicidade do livro para alcançar o público. Muitas igrejas estão oferecendo seminários e vários pastores estão discutindo as alegações do romance em seus sermões. Assim, o sucesso dessa novela e seu filme proporcionam oportunidade única para os cristãos aprenderem sobre as origens de nossa fé, e compartilharem os fundamentos de nossas crenças com audiência maior.


Foi o enfrentamento dessa confusão sobre fato ou ficção e verdade ou erro entre nossos amigos, familiares e colegas de trabalho, que nos motivou a desenvolver uma série de seminários evangelísticos intitulada “O Código da Vinci ou A Trapaça de Da Vinci: São os fatos mais singulares que a ficção?”15 Este artigo foi baseado em centenas de horas de pesquisa que gastamos para contestar mais de 50016 erros e distorções dessa novela, embora mencionemos aqui apenas alguns.


Acreditamos que os seguintes tópicos sejam interessantes: Historicidade das Escrituras, A Divindade de Cristo e Casou-se Jesus com Maria Madalena?


Historicidade das Escrituras e a Divindade de Jesus


Dan Brown faz referência em “O Código da Vinci,” p. 231, que “oitenta outros evangelhos” foram omitidos em favor dos evangelhos “menos confiáveis” do Novo Testamento, como Mateus, Marcos, Lucas e João, que foram incluídos no cânon. Os eruditos modernos17 afirmam que o primeiro evangelho foi o de Marcos (65 d.C.), seguido de Mateus, Lucas/Atos (80-85 d.C.), e finalmente João (90 d.C.). Uma das primeiras listas dos 27 livros do Novo Testamento está contida uma carta de Atanásio de Alexandria, datada de 367 d.C..


Isso aconteceu depois do Concílio de Nicéia, em 325 que não foi realizado pelo Imperador Constantino para “endossar” o fato de que Jesus era divino, o qual tinha sido esclarecido tempos antes, mas para discutir se Ele era co-eterno com Deus ou um ser criado, como alegava Ário de Alexandria. Esse concílio pôs fim à apostasia ariana.


Embora Brown não utilize a expressão “Evangelhos Gnósticos”, entendemos que são a esses escritos que Teabing, seu “especialista” fictício, se refere como anteriores ao Novo Testamento, e que foram “implacavelmente eliminados” pelos líderes eclesiásticos. Escritos entre o segundo e quinto séculos, eles são contrafações antigas apresentadas como escritos por autores do Novo Testamento.18


Curiosamente, o gnosticismo (do grego gnosis, ou conhecimento, no sentido de conhecimento especial), retrata Jesus não como um mortal, como Brown alega, mas como totalmente espiritual. Essa visão docética (do significado grego “aparência”) de Jesus significa que os gnósticos esperavam a salvação não de um Jesus plenamente divino e humano, mas de sua própria centelha divina no ser. Jesus veio apenas para comunicar o conhecimento de como sair do estado mortal, se tivermos essa centelha. Segundo eles, Sua morte na cruz foi irrelevante para a nossa salvação.


Um dos maiores “furos” do “O Código da Vinci” é a caracterização equivocada que Brown faz do evangelho gnóstico no que tange à natureza de Jesus, a fim de “provar” que Jesus era um simples mortal casado com Maria Madalena. Enquanto Brown tenta usar esses textos para sustentar sua alegação da humanidade de Jesus, em realidade os gnósticos rejeitaram a humanidade de Cristo em favor de uma natureza puramente divina!


Evidências da Crença na Divindade de Cristo


Os indícios para crermos na divindade de Cristo podem ser encontrados em o Novo Testamento, nas referências extra-bíblicas, assim como em inscrições e artes nas catacumbas cristãs romanas.19


Além das muitas referências em o Novo Testamento, que o próprio Cristo e outros fazem sobre Sua divindade (incluindo a declaração de que “antes que Abraão existisse, EU SOU”, em João 8:58), para uma pessoa da antiguidade que teve uma morte hedionda, existe um número impressionante de referências extra-bíblicas a Ele. Dentre elas estão as citações do historiador judeu Josefo (37-100 d.C.) sobre Jesus e seu irmão Tiago,20 assim como menções críticas a Cristo no Talmude de Babilônia,21 e outras referências a Jesus e aos cristãos em cartas de vários romanos que criticavam o cristianismo, como a do Plínio, o Moço.22


O símbolo inicial do cristianismo era o peixe. Peixe, em grego, é ichthys, um acróstico para “Jesus Cristo, o Salvador Filho de Deus” (Iesous Christos Theou Yios Soter23). Os sepulcros das catacumbas romanas do primeiro ao quarto séculos demonstram através de inscrições e desenhos artísticos (Jonas, Daniel na cova dos leões, pães e peixes) comuns aos túmulos judaicos da época, que os cristãos romanos compartilhavam com os judeus o mesmo estilo de funeral que evidenciava a esperança na ressurreição. Para os cristãos, essa ressurreição viria através de Jesus para todo ser humano e demonstrava que “não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.” (Gálatas 3:28).


Jesus Se casou com Maria Madalena?


Ainda que seja difícil argumentar com base no silêncio, podemos certamente admitir que não haja nenhum registro de qualquer casamento de Jesus. Visto que o Novo Testamento registra serem casados alguns de Seus discípulos (Pedro, por exemplo24), então se esperaria que um suposto casamento de Jesus também fosse mencionado. A genealogia era, e ainda é, uma questão muito importante para as leis e a religião no Oriente Médio. Tanto Mateus como Lucas dedicaram parte de seus textos à genealogia de Jesus.


Maria Madalena ou Miriam de Magdala (na Galiléia) é mencionada 14 vezes em o Novo Testamento, sempre pelo nome. Por ser chamada apenas “de Magdala”, e por sabermos que ela viajou com Jesus e apoiou Seu trabalho, Maria deve ter sido uma mulher solteira ou viúva com alguns recursos financeiros. Jesus a libertou de sete demônios e ela foi uma das poucas pessoas que permaneceram com Jesus até a cruz, e uma das primeiras a ver Cristo ressuscitado. Possivelmente, pela graça de ser a primeira a ver Jesus ressuscitado, os primeiros pais da Igreja pensaram que ela deveria ser uma pessoa de grande virtude, e referiram-se a ela como o “apóstolo para os apóstolos”25.


Maria Madalena não estava ligada à prostituição. Isso aconteceu a partir de um sermão feito pelo papa Gregório, no quinto século, que a identificou com outras Marias do Novo Testamento e outras mulheres que relacionamos como pecadoras arrependidas de uma vida de prostituição. Desde então, Maria Madalena tem sido apresentada na arte com um vaso de alabastro, que se originou da história de Mateus 26:7, Marcos 14:3 e Lucas 7:37. Isso é tudo o que sabemos sobre Miriam de Magdala, até que romances medievais retomaram sua história acrescida de detalhes por Dan Brown em “O Código da Vinci”.


Conclusão


Ainda que o livro de Dan Brown, “O Código da Vinci,” tenha obtido grande popularidade, suas alegações de fatos sobre as crenças cristãs primitivas são fáceis de refutar, mas isso requer conhecimento da história da igreja primitiva, assim como das culturas grega, romana e judaica. Essa novela e o filme nos dão a oportunidade de “responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós.” (I Pedro 3:15).


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Ron Bingham e Maxine Bingham são pós-graduados, respectivamente em Física e estudos do Oriente Médio. Eles também lideram um ministério adventista, o Seminários Internacionais Agora, a fim de alcançar pessoas através de evidências da verdade bíblica. Este artigo está baseado num seminário que desenvolveram para expor os erros de O Código da Vinci. Eles podem ser contatados através do e-mail davincicon@agorapr.com


REFERÊNCIAS
1. Dan Brown, O Código da Vinci (Rio de Janeiro: Sextante, 2004).
2. Sony Pictures Corporation, lançado em maio de 2006.
3. The Daily Mail online, “Archbishop attacks the Da Vinci Code,” por Jo Knowsley, abril de 2006.
4. Times Online, “Da Vinci Code author wins battle against plagiarism claim,” por Philippe Naughton, 7 de abril de 2006; http://www.timesonline.co.uk/article/0,200-2123521,00.html.
5. “Simbologia” não existe como especialidade acadêmica na Universidade de Harvard.
6. Um romance medieval de cerca de 1200 d.C., In Our Time: The Holy Grail, de Melvyn Bragg, 15 de maio de 2003, BBC Radio 4, http://www.bbc.co.uk/radio4/history/inourtime/inourtime_20030515.shtml.
7. Para mais detalhes ver: http://www.greatbuildings.com/buildings/Pyramide_du_Louvre.html.
8. Uma conhecida fraude do século 20, perpetrada por Pierre Plantard; ver programa de TV “60 Minutos,” The Priory of Sion: Is The “Secret Organization” Fact or Fiction? Levado ao ar em 30 de abril de 2006. http://www.cbsnews.com/stories/2006/04/27/60minutes/main1552009.shtml.
9. A Biblioteca Nacional da França, mas qualquer um pode inserir documentos nela.
10. A única verdade no prólogo é que a Opus Dei possui realmente sua sede na cidade de Nova Iorque.
11. Por exemplo, Salon, “The Da Vinci Crock,” por Laura Miller, 29 de dezembro de 2004, http://dir.salon.com/story/books/feature/2004/12/29/da_vinci_code/index.html?pn=1.
12. Tais como: Bart D. Ehrman, Truth and Fiction in The Da Vinci Code (Oxford University Press, 2004) e Ben Witherington III, The Gospel Code (InterVarsity Press, 2004).
13. O Código da Vinci, p. 253.
14. The Spectator (UK), “Blessed are the spin doctors,” por Auston Ivereigh e “Opus Dei is so normal it’s scary,” por Mary Wakefield, volume de 6 de maio de 2006.
15. As primeiras séries aconteceram em maio de 2006, com o apoio da Igreja Adventista de Santa Cruz, na Califórnia, e Seminários Internacionais Agora, o ministério evangelístico dos autores. Contatar davincicon@agorapr.com, para mais detalhes sobre esses seminários que utilizamos para ampliar o alcance evangelístico das igrejas adventistas.
16. Ver James L. Garlow, The Da Vinci Code Breaker: An Easy to Use Fact Checker (Bethany House Publishers, 2006).
17 Ver, por exemplo, Bart Ehrman, Introduction to the New Testament, The Teaching Company, 2000 (www.teach12.com; 1-800-832-2412), no qual nos temos baseado, assim como outras fontes confiáveis.
18. Para fins deste artigo, baseamo-nos primeiramente em Bart Ehrman, Lost Christianities: The Battles for Scripture and the Faiths We Never Knew (Oxford University Press, 2003).
19. The Catacombs of Rome: http://www.catacombe.roma.it/.
20. Verbete da Wikipedia, http://en.wikipedia.org/wiki/Flavius_Josephus.
21. Early Christian Writings: http://www.earlychristianwritings.com/talmud.html.
22. Probe Ministries: http://www.probe.org/content/view/18/77/.
23. http://www.eureka4you.com/fish/fishsymbol.htm.
24. Mateus 8:14.
25. No comentário sobre Cantares, 24-26, de Hipólito, um dos pais da Igreja (170-236).

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