A Ceia do Senhor – A Ceia do Senhor é uma participação nos emblemas do corpo e do sangue de Jesus, como expressão de fé nEle, nosso Senhor e Salvador. Nessa experiência de comunhão, Cristo está presente para encontrar-Se com Seu povo e fortalecê-lo. Participando da Ceia, proclamamos alegremente a morte do Senhor até que Ele volte. A preparação envolve o exame de consciência, o arrependimento e a confissão. O Mestre instituiu a cerimônia do lava-pés para representar renovada purificação, para expressar a disposição de servir um ao outro em humildade semelhante à de Cristo e para unir nossos corações em amor. O serviço da comunhão é franqueado a todos os crentes cristãos. – Crenças Fundamentais, 15
No que concerne à Ceia do Senhor, os adventistas não aceitam a idéia de que os emblemas do pão e do vinho se transformam no próprio corpo e sangue de Jesus. Cremos que essa interpretação coloca um excessivo significado no pão e no vinho. Mas será que evitando um extremo não poderemos cair no outro: ver pouco significado nesses emblemas alimentares?
Na realidade, a Santa Ceia é um evento rico em significação e experiência que vai muito além do simbolismo. Ela reforça os laços que me unem a Deus e aos cristãos com os quais me relaciono. Ela me alimenta – do contrário eu ficaria espiritualmente enfraquecido e subnutrido a ponto de morrer.
A Ceia do Senhor é um memorial e um testemunho. E, muito mais que isso, é a ocasião em que o crente se encontra com Aquele em quem crê, e se satisfaz. Ao vir à mesa da comunhão, encontro a paz e a segurança.
A Última Páscoa
A Santa Ceia deriva seu significado da morte de Jesus Cristo e de certos comentários que Ele fez ao celebrar a última páscoa com Seus discípulos. Para os israelitas, a páscoa lembrava o livramento do Egito. Na primeira páscoa, Deus fizera um concerto com Seu povo; da mesma forma, Cristo coroou Sua última refeição com os discípulos com um concerto. Só que essa última refeição marcou o fim da páscoa e o início de uma nova celebração – a Ceia do Senhor.
Todos os três evangelistas sinóticos (Mat. 26:26-29; Mar. 14:22-25; Luc. 22:15-20) registraram as palavras ditas por Cristo na ocasião em que instituiu a Ceia. O mesmo fez Paulo em I Coríntios 11: 23-25. Ao mesmo tempo que todos concordam no relato básico, cada um por sua vez complementa o outro com detalhes. Paulo, Marcos e Mateus se referem ao concerto. Marcos fala do sacrifício substitutivo de Cristo (“em favor de muitos”); Mateus vai mais longe, acrescentando a idéia da “remissão dos pecados” através da morte de Cristo. Paulo nos brinda com o conceito da Ceia do Senhor como “memorial” da morte de Jesus. Assim, podemos perceber que a igreja primitiva celebrou a Santa Ceia como uma “instituição” carregada de diversos significados.
Lavaram Seus Pés
Antes de avançar muito em nossos pensamentos, vamos rememorar um pouco os acontecimentos que cercaram a última páscoa de Jesus com Seus discípulos. Eles vieram completamente despreparados. Ao mesmo tempo “sabendo Jesus que era chegada a Sua hora de passar deste mundo para o Pai” (João 13:1), a atitude dos discípulos só acrescentava angústia a Jesus. Judas fizera um pacto secreto para trair a Cristo. Os demais discípulos estavam preocupados com a grandeza pessoal. Cobiça. Enquanto isso, a água, a bacia e a toalha, sobravam ali num canto. Nenhum discípulo expressou o desejo de servir.
Ao invés de repreendê-los, Jesus, num ato de amor, tomou a bacia e a toalha e passou a lavar os pés dos discípulos. Para o Criador do Universo e Salvador da humanidade isso não era nenhuma novidade. Muito tempo antes, escolhera Ele o papel de servo, trocando toda a dignidade pela humilhação e serviço (Filip. 2:5-8).
Esse ato abriu os olhos dos discípulos. Perceberam o espírito de que estavam possuídos. Ao chegar a vez de Pedro, ele não quis participar. Jesus teve que dizer: “Se Eu não te lavar, não tens parte comigo.” João 13:8. Na realidade, Ele estava dizendo: “Pedro, o que Eu quero não é exatamente lavar os seus pés, mas trazê-lo para mais perto de Mim. O que você mais precisa é da purificação celestial, aquela que muda o coração.” (Ver O Desejado de Todas as Nações, pág. 646)
E Pedro começou a entender. Começou a ver “quando Jesus Se cingira com a toalha para lhes lavar o pó dos pés, desejava, por aquele mesmo ato, lavar-lhes do coração a discórdia, o ciúme e o orgulho”. – Ibidem. Todo que vem à mesa do Senhor necessita essa experiência. Por essa razão, Jesus disse: “Eu vos dei o exemplo, para que, como Eu vos fiz, façais vós também.” João 13:15.
Faz parte da nossa natureza zelar por nós mesmos, chamar a atenção, levar os outros a reconhecer nosso valor. Mas, pela ordenança do lava-pés, nosso Senhor ensina-nos uma melhor forma de viver. Mostra-nos uma humildade que dá mais crédito e atenção aos interesses dos outros ao invés do constante favorecimento próprio (Filip. 2:3 e 4).
Com boa disposição, exame de consciência e oração, devemos participar do lava-pés antes de chegarmos à mesa do Senhor. É a preparação da nossa mente para fruirmos a comunhão.
Um Símbolo do Evangelho
É claro que Jesus e Seus discípulos celebraram a páscoa juntos anteriormente. Mas essa ocasião foi diferente. Jesus sabia que seria a última páscoa para eles; na realidade, não precisariam mais dela.
Seus seguidores tinham que entender que haviam presenciado o despontar de uma nova e diferente era. A entrada era o próprio Cristo, e o início seria provocado pelos eventos que se dariam em seguida. Então, Jesus modificou a refeição pascal para outra que representasse melhor Sua morte, ministério e missão.
A nova refeição – a Ceia do Senhor – então significa o próprio evangelho. Ou seja:
1. As dificuldades e dores da existência humana não trazem qualquer solução em si mesmas. O destino ou o acaso também não ajudam nada. Não temos poder algum para nos livrar a nós mesmos. Somente Cristo pode fazê-lo. Ele proveu a chave para o nosso livramento ao dar a Sua própria vida – “o sangue da nova aliança, derramado em favor de muitos”. Mar. 14:24. Essa é a solução de Deus.
Ao chegarmos à mesa da comunhão, assumimos que também para nós esse é o caminho aceito. Demonstramos nossa receptividade e gratidão em face da solução divina.
2. Em virtude da solução divina, deixamos de ser estrangeiros e desamparados pelos caminhos da vida. Agora, temos um lar. Somos filhos. E também não temos que nos envergonhar de nós mesmos. Ou seja, nossos pecados foram perdoados (Mat. 26:28) e a Ceia do Senhor confirma isso. Da mesma forma que o próprio perdão, a Santa Ceia é um dom de Deus a Seus filhos.
3. Pelo partir do pão e participar da refeição com nossos irmãos e irmãs, confirmamos nossa filiação a uma família. Essa família é o universal corpo de Cristo. Isso é o que Paulo tinha em mente, quando disse: “Porque nós, embora muitos, somos unicamente um pão, um só corpo; porque todos participamos do único pão.” I Cor. 10:17.
A refeição une aqueles que se assentam ao redor da mesa. “Todos Me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, ... pois, perdoarei as suas iniqüidades e dos seus pecados jamais Me lembrarei.” Jer. 31:34. A santa refeição expressa a comunhão do novo concerto.
4. Ao participar dos alimentos, participamos também da proclamação das verdades centrais do evangelho: a morte sacrifical de Jesus Cristo e nossa crença na Sua segunda vinda (I Cor. 11:26; Mat. 26:29). Tanto Jesus quanto Paulo procuram dirigir o nosso olhar e expectativa para esse glorioso momento da história. Na igreja primitiva, a celebração da Santa Ceia certamente terminava com a exclamação: Maranata – Vem, Senhor! (I Cor. 16:22).
A Ceia do Senhor coloca o crente entre a morte de Cristo e Sua volta, como que dependendo de ambos. E nisso reside toda a segurança e esperança.
Através do Espírito Santo, o Cristo ressurreto está verdadeiramente presente à Santa Ceia. Nessa ocasião, “Cristo Se encontra com Seu povo, e os revigora por Sua presença”. – O Desejado de Todas as Nações, pág. 656. Por isso, entender a refeição pascal meramente como um símbolo para auxiliar a memória ou como um instrumento pelo qual o crente torna público o seu testemunho diminui enormemente o verdadeiro significado da Ceia do Senhor. A refeição é, de fato, um encontro entre o Salvador ressurreto e a pessoa que nEle crê. A graça derivada da celebração da Santa Ceia é a graça da presença de nosso Senhor. Que ninguém subestime o poder para a renovação espiritual que advém pela presença de Cristo (João 6:54 e 57).
Quem Pode Participar?
O princípio “todo o que tem sede venha” pode ser aplicado à Ceia do Senhor. Todo aquele que crê que a única solução para a humanidade vem através de Cristo; todo aquele que deseja sinceramente a purificação, aceitação e fortalecimento por Cristo, pode se achegar à Sua mesa. A Ceia é tão aberta quanto possível.
Sentimentos de insuficiência podem levar um pecador arrependido a concluir que ele não pode se aproximar da mesa do Senhor. Mas a pessoa que sente sua necessidade, que tem fome e sede, é exatamente quem o Senhor convida para que venha, coma e beba.
Participar da mesa da comunhão também não deve ser motivo de exaltação própria. Ao contrário: “Quanto mais contemplarmos a cruz de Cristo, tanto mais adotaremos a linguagem do apóstolo quando disse: ‘Longe esteja de mim gloriar-me a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo.’ Gál. 6:14.” – Ibidem, pág. 661.
Nem deveríamos nos surpreender vendo pecadores vindo à Santa Ceia. Quem somos nós para julgá-los? “Deus não deixou aos homens dizer quem se apresentará nessas ocasiões. Pois quem pode ler o coração?” – Ibidem, pág. 656. O tratamento dado por Cristo a Judas nos ensina que identificar o “trigo” e o “joio” não é importante para a Santa Ceia. Se uma pessoa se acha em condições para vir, ela está convidada.
Veja que Paulo diz: “Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e, assim, coma do pão, e beba do cálice.” I Cor. 11:28; cf. I Cor. 5:11. Acho que o único motivo para a exclusão da Ceia do Senhor é a descrença e a prática de uma vida que negue abertamente a Jesus Cristo (I Cor. 16:22). Mas esse é um assunto que cada pessoa deve resolver a partir de um exame de consciência. Deveríamos olhar os outros com a mesma generosidade e amor com que Cristo nos trata.
O dom da Santa Ceia deveria despertar em nós alegria e expectativa pela participação. É um ponto alto de nossa experiência cristã que proporciona a segurança necessária para seguir em frente, firme e regozijante, pela luz salvadora da cruz. De que outra forma poderíamos saciar nossa fome e mitigar nossa sede?
Jan Paulsen
Ex-Presidente da Associação Geral