sexta-feira, 1 de julho de 2011

Jejum como Estilo de Vida

 
A prática do jejum como disciplina espiritual é defendida pelos mais diferentes segmentos religiosos. Até nas religiões pagãs antigas era praticado como forma de preparo para o encontro com uma divindade. Acreditava-se que essa experiência proporcionava uma abertura para a influência divina [1].
Além dos cristãos, outros grupos continuam com essa prática em nossos dias. Dentre esses segmentos, podemos destacar os seguidores de Maomé, que promovem o jejum no mês de Ramadã, quando comemoram a entrega do Alcorão por Alá.
No cristianismo, o jejum é praticado de diferentes maneiras e por motivos diversos. Em meio a essa diversidade, precisamos entender o que é e o que não é jejum, a relevância desse rito no ministério de Cristo, qual é seu sentido amplo e a importância dessa disciplina em nosso preparo diário para o encontro com Cristo.

O que o jejum não é

Para que não nos sintamos confusos na exposição desse ensino bíblico, vamos mostrar em que não consiste o jejum na visão bíblica.
1. Não é penitência (expiação de pecado, sacrifício para se livrar de culpa, aflição, tormento ou ato para demonstrar que alguém é mais santo do que o outro). A Bíblia deixa claro que o perdão e a purificação vêm pelo arrependimento, confissão e abandono do pecado, e só existe um Ser que pode fazer isso por nós. A Palavra diz: “Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (ljo 1:9).
2. Não é ritual público de tristeza para mostrar superioridade. Nos dias de Cristo, era comum os fariseus jejuarem para mostrar uma fachada de “santidade”. O que mostravam no exterior não correspondia ao que estava no interior, pois o coração deles estava longe de Deus. O Salvador foi ao ponto em Seus ensinos para que não caiamos no mesmo erro. Ele afirmou: “Quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram o rosto com o fim de parecer aos homens que jejuam. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa” (Mt 6:16).
3. Não é greve de fome. O jejum não deve ser usado para chamar a atenção de Deus e das pessoas para nossos objetivos e metas. O contexto de Isaías 58 mostra claramente isso. No verso 3, o profeta descreve o clamor dos “grevistas”: “Por que jejuamos nós, e Tu não atentas para isso? Por que afligimos a nossa alma, e Tu não o levas em conta?” Por que o que eles faziam não era aceito? No fim do verso vem a resposta: “Eis que, no dia em que jejuais, cuidais de vossos próprios interesses e exigis que se faça todo o vosso trabalho.”
É importante compreender essas coisas porque o que já se viu no passado se repete em nossos dias. O Espírito de Profecia diz: “É verdade que há pessoas com mente desequilibrada, que se consideram muito religiosas e que impõem a si mesmas jejum e oração com prejuízo de sua saúde. Essas pessoas se deixam enganar. Deus não requereu isso delas. [...] Confiam em suas boas obras para a salvação e estão procurando comprar o Céu por obras meritórias próprias em vez de, como deve todo pecador, depender somente dos méritos de um Salvador crucificado e ressurreto.” [2]

Em que consiste o jejum

O sentido teológico do jejum transcende o significado de se abster de alimento por determinado período de tempo. “O jejum é a oração do corpo.” [3] É o momento em que o corpo se priva daquilo de que gosta e se entrega, sem reserva, à comunhão íntima com o Criador e Salvador.
Essa comunhão se desenvolve na presença de Deus, ouvindo Sua voz por meio da Bíblia e em oração, reagindo ao que Ele fala. Nesse relacionamento diferenciado, podemos notar o verdadeiro sentido do jejum. A palavra profética diz: “O espírito do verdadeiro jejum e oração é o espírito que rende a Deus mente, coração e vontade.” [4]
O jejum pode ser completo ou parcial. O completo é aquele em que a pessoa se abstém de todo tipo de alimento por certo período de tempo. No jejum parcial, a pessoa faz uso de frutas frescas, sopas, caldos, sucos naturais nos horários normais das refeições. O uso de água deve ser normal em qualquer opção de jejum.

O jejum no ministério de Cristo

Logo depois do batismo e antes de começar Seu ministério, Jesus jejuou quarenta dias e quarenta noites. “O grande objetivo por que Cristo suportou aquele longo jejum no deserto, foi ensinar-nos a necessidade da abnegação e da temperança.” [5]
Por meio da abnegação e da temperança, Ele pôs sob controle o apetite e mostrou que não havia desculpa para a queda de Adão e Eva pela simples satisfação do apetite. Assim, onde eles falharam, Cristo venceu e deixou o sublime exemplo de que não há desculpa para nenhum seguidor Seu quebrar o relacionamento por meio do pecado.
Não foi sem lutas e dificuldades que Ele venceu e subjugou o apetite e suas paixões humanas. Satanás usou as mesmas armas que levaram nossos pais à queda, [6] mas Ele Se firmou no poder da Palavra e disse: “Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus.” [7]
Com essas palavras, Cristo deixa clara a receita para a vitória sobre as confederações satânicas nos momentos mais extremos e no cotidiano – comunhão com Deus por meio do estudo da Bíblia, oração e jejum. Foi assim que Ele viveu e venceu a cada dia.

Sentido amplo do jejum

O capítulo 58 de Isaías explica esse conceito ampliado do jejum, jejuar é mais do que se abster de alimento; é uma disciplina que aprofunda o compromisso com um estilo de vida segundo o modelo de Cristo. Ele viveu como amigo de todas as pessoas e classes; amava todos e Seu amor ia além de palavras.
“O Salvador misturava-Se com os homens como uma pessoa que lhes desejava o bem. Manifestava simpatia por eles, ministrava-lhes às necessidades e granjeava-lhes a confiança. Ordenava então: ‘Segue-Me’” (Io 2L19). [8]
Aqui está o modelo de como se deve viver Isaías 58, especialmente os versos 6, 7 e 13. O Espírito de comunhão, compaixão e amor, esse sentimento que acompanha a pessoa enquanto está em jejum, deve acompanhá-la em todos os seus relacionamentos sociais, familiares, de trabalho e na vida em geral. O jejum só faz sentido quando nos projeta para uma vida de santificação antes, durante e depois.
A disciplina do jejum deve ser praticada tendo em vista nosso preparo diário para o encontro com Cristo. A orientação profética para os nossos dias é: “Agora e daqui por diante até ao fim do tempo, deve o povo de Deus ser mais fervoroso, mais desperto, não confiando em sua própria sabedoria, mas na sabedoria de seu Líder. Devem pôr de parte dias de jejum e oração. Pode não ser requerida a completa abstinência de alimento, mas devem comer moderadamente, do alimento mais simples.” [9]
A disciplina habitual do jejum aliada ao objetivo do SEE, que visa a desenvolver e consolidar o hábito de buscar a Deus na primeira hora de cada manhã, pode ser uma grande bênção tanto para o corpo como para a alma. Eilen G. White diz: “É impossível avaliar os bons resultados de uma hora ou mesmo de meia hora diária dedicada à Palavra de Deus” [10] e à oração. Outro conselho oportuno: “jejuar um dia por semana lhes proporcionaria incalculável benefício.” [11]
Podemos afirmar com segurança que o caminho para o preparo diário para o encontro com Cristo a qualquer momento passa pela comunhão e o jejum de forma habitual.

Referências

1. Colin Brown, Novo Dicionário Internacional de Teologia do Nouo Testamento (Vida Nova: São Paulo, 1982).
2. Eilen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 3, p. 172,173.
3. Madeline S. Johnston, “Jejum com equilíbrio”, Ministério, maio/ junho de 1995.
4. Eilen G. White, Conselhos Sobre o Regime Alimentar, p. 189.
5. Conselhos Sobre Saúde, p. 125.
6. No Deserto da Tentação, p. 52.
7. Mateus 4:4.
8. Ellen G. White, Benejjcência Social, p. 60.
9. Eventos Finais, p. 82.
10. Conselhos Sobre a Escola Sabatina, p. 42.
11. Conselhos Sobre o Regime Alimentar, p. 189.
Texto de autoria de Miguel Pinheiro, diretor do Departamento de Mordomia Cristã da Divisão Sul-Americana da IASD. Publicado na RA de Mai/2010.
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