Quando Jesus declarou, em Seu diálogo com Nicodemos, que “ninguém subiu ao Céu, senão Aquele que de lá desceu, ... o Filho do homem” (Jo 3:13), pelo menos Enoque, Moisés e Elias já estavam no Céu. A respeito de Enoque é dito que ele andou “com Deus e já não era, porque Deus o tomou para Si” (Gn 5:24) e que, “pela fé, Enoque foi trasladado para não ver a morte; não foi achado, porque Deus o trasladara” (Hb 11:5). Sobre Moisés somos informados de que o arcanjo Miguel “contendia com o diabo e disputava a respeito do corpo de Moisés” (Jd 9). Quanto a Elias, o texto sagrado fala de um tempo “quando estava o Senhor para tomar Elias ao Céu por um redemoinho” (2Rs 2:1) e que, realmente, “Elias subiu ao Céu num redemoinho” (v. 11). Já no evento da transfiguração de Jesus (ver Mt 17:1-8; Mc 9:2-8; Lc 9:28-36), Moisés e Elias “apareceram em glória” para consolá-Lo a respeito de Sua morte (Lc 9:30, 31).
Os espíritas costumam usar esse reaparecimento de Moisés e Elias para sustentar a teoria antibíblica da reencarnação, ou seja, de que uma pessoa pode morrer várias vezes, reencarnando o seu espírito em uma sucessão de novos corpos. Mas o texto bíblico é claro em afirmar que “aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo” (Hb 9:27). Além disso, o pretenso reaparecimento do profeta Samuel para o iníquo rei Saul, relatado em 1 Samuel 28, não passa de uma experiência mediúnica de origem satânica. A Bíblia condena toda e qualquer forma de necromancia, ou seja, de comunicação com os mortos (ver Lv 19:31; 20:6, 27; Dt 18:9-12; Is 8:19, 20), e Saul foi condenado pelo Senhor, entre outras coisas, “porque interrogara e consultara uma necromante” (1Cr 10:13). Portanto, os reaparecimentos de Moisés e Elias não podem ser considerados reencarnações espíritas, e sim, manifestações reais, possíveis apenas porque Moisés fora ressuscitado dentre os mortos e Elias havia sido trasladado ao Céu sem provar a morte.
Mas permanece a indagação: se Enoque, Moisés e Elias foram levados ao Céu, como explicar a declaração de que “ninguém subiu ao Céu, senão Aquele que de lá desceu, ... o Filho do homem” (Jo 3:13)? Uma possibilidade de se entender o sentido do texto seria restringir temporalmente a sua abrangência, assumindo que Jesus estava Se referindo apenas aos Seus contemporâneos. Em outras palavras, Jesus estaria dizendo que ninguém vivo em Seus dias havia subido ao Céu. Portanto, a única pessoa daquela época que estivera no Céu era o próprio Cristo, o que Lhe colocava em uma posição única como revelador pleno dos propósitos divinos.
Outra possibilidade, talvez mais consistente que a anterior, seria reconhecermos a existência de uma distinção de status entre os três seres humanos levados ao Céu (Enoque, Moisés e Elias) e Cristo que, além de ter vindo do Céu, fizera parte dos conselhos da Divindade. Ellen G. White parece endossar essa posição ao se referir ao texto em discussão (Jo 3:13) com as seguintes palavras: “Jesus Cristo era a Testemunha Verdadeira. Ele declara que veio do Pai” com o propósito de “revelar o Pai” (The Ellen G. White 1888 Materials, p. 885). “Havendo estado nos conselhos de Deus e habitado nas eternas alturas do santuário, todos os elementos da verdade estavam nEle e eram Seus, pois era um com Deus” (Fundamentos da Educação Cristã, p. 190). Nesse sentido a expressão “ninguém subiu ao Céu” deveria ser entendida, não simplesmente como ser levado ao Céu (como Enoque, Moisés e Elias), mas como participar dos “conselhos de Deus” no Céu (como apenas Cristo). Sem dúvida, a ênfase do Evangelho de João é que “o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (Jo 1:1).
Revista do Ancião (outubro – dezembro de 2008)
Dr. Alberto Timm