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domingo, 5 de fevereiro de 2012

O Trabalho dos Massoretas

O hebraico, por nós já estudado, como era originalmente escrito, constava apenas de consoantes, sendo os sons vocálicos supridos pelo leitor. Este processo obrigava o leitor a pensar e ir interpretando o texto, para descobrir-lhe o exato sentido, pois três consoantes (assim eram formadas as palavras em hebraico) com vogais diferentes, podem indicar coisas muito diversas, como ilustram as consoantes portuguesas p t t, nas palavras pateta, patota, e patote, e ainda b r d – barda, bardo, borda, bordo, etc.
A escrita das consoantes apenas, foi processo adequado enquanto o hebraico continuou sendo um idioma falado. Quando aparecia uma palavra que podia ser ambígua, eram usadas “letras vogais” para deixar o texto mais claro. Quatro consoantes fracas, algumas vezes eram usadas como vogais = álefe, hê, vau e o iode. Quando o hebraico foi deixando de ser uma língua falada (já no tempo de Cristo não era uma língua viva) muito mais difícil ficou a pronúncia correta das consoantes sem sinais vocálicos. A pronúncia correta das palavras era transmitida pela tradição oral, mas em breve foi sentida a necessidade de ser esta representada por escrito.
A prova de que a palavra formada tão somente de consoantes é ambígua, na sua acepção, nós a temos em um exemplo da Bíblia em que as três consoantes não foram corretamente interpretadas. Hebreus 11:21 diz que Jacó “adorou encostado à ponta do seu bordão”, ao passo que em Gênesis 47:31 lemos que ele “inclinou-se sobre a cabeceira da cama”. A palavra hebraica para designar cama e bordão consta de três consoantes M T H, as quais no texto hebraico são lidas com as vogais assim: M(i) T(a) H, cama; o autor da Epístola aos Hebreus tirou a citação da Septuaginta, cujos tradutores, leram a palavra desta maneira: M(a) T(e) H, bordão. (Ver História, Doutrina e Interpretação da Bíblia – Joseph Angus, vol. l, p. 20).

Os Massoretas

Massoretas eram os escribas judeus que se dedicaram a preservar e cuidar do manejo do texto hebraico do Velho Testamento. Às vezes o termo também é empregado para o comentarista judeu do livro sagrado. Eles substituíram os escribas (Sopherins) por volta mais ou menos do ano 500 A.D. e prosseguiram em seu dedicado trabalho até o ano 1.000 A.D.
Os massoretas tinham publicado manuais que serviam de orientação para copiar o texto. Nestes manuais, chamados “massora” (termo hebraico técnico para a primitiva tradição quanto à forma correta do texto das Escrituras), se encontravam: a) normas orientadoras que os copistas deviam seguir enquanto estivessem copiando o texto sagrado; b) todas as regras gramaticais sobre a língua hebraica; c) os princípios sugeridos pelo Talmude na transmissão do texto.
O minudente e consciencioso trabalho estatístico que os massoretas realizaram é impressionante, empregando toda a técnica que é possível ao ser humano para assegurar a exata transmissão do texto. Dentre as estritas e minuciosas regras a serem seguidas na cópia dos manuscritos, uma era a seguinte: nenhuma palavra ou letra devia ser escrita de memória. Antes de iniciarem propriamente a cópia, eles contavam os versos, as palavras e letras de cada seção e se os números não correspondessem na nova cópia, o trabalho era rejeitado. Além disso existem em nossas Bíblias enormes coleções de notas massoréticas, tratando de assuntos tais como: contavam as palavras de um livro e assinalavam a palavra central, registravam o número de vezes que uma palavra ou frase específica ocorriam, faziam listas com palavras que apareciam uma, duas ou três vezes no Velho Testamento, anotavam as construções e formas já desusadas. Eles notaram, por exemplo, que a letra central da Lei se achava em Lev. 11:42, quanto aos salmos, a letra central está no salmo 80:4, o versículo central é o 36 do salmo 78.
Desde que o supremo alvo dos massoretas era transmitir o texto tão fielmente como o tinham recebido, não faziam nele nenhuma alteração. Onde presumiam que tinha havido algum erro de transcrição, ou onde uma palavra não estava mais em uso polido, colocavam a palavra certa ou preferível, na margem. Neste caso, a palavra correta ou preferida e que tencionavam que fosse lida, chamavam “Qerê” – o que deve ser lido, mas as suas vogais eram postas sob as consoantes da palavra no texto inviolável (esta era chamada de Kethibi = o escrito).

O Tetragrama Sagrado para o Nome de Deus

Um dos casos mais famosos de “Qerê”, é o tetragrama usado para Deus. Deus é designado na Bíblia por vários nomes, porém o mais comum era aquele que O designava por quatro consoantes hebraicas, o “iod”, o “hê”, o “vau”, e novamente o “hê”, conhecidas como Y H W H, algumas vezes também transliteradas em J H V H.
Os judeus eram excessivamente respeitosos para com o nome da Divindade, assim para evitar que alguém o profanasse, pronunciando-o, usavam em seu lugar Adonai = o Senhor.
Os massoretas colocavam sob o tetragrama do texto hebraico consonantal as vogais a, o, â da palavra Adonai. Desde que este título era tão comum, pois aparece no Velho Testamento 6.823 vezes, os massoretas acharam desnecessários chamar a atenção para este “Qerê” = o que deve ser lido; recebendo até o nome de “Qerê Perpétuo”. Já no tempo da Reforma quando se incrementou o estudo das línguas bíblicas, ao lerem o Velho Testamento, por não compreenderem bem o problema de “Qerê e Kethibi” uniram as vogais da palavra Adonai com as consoantes do tetragrama, aparecendo a palavra hebraica Jeová, até aquele tempo inexistente. A pronúncia correta em português para este nome da Divindade deve ser Javé ou Jaweh.
Os massoretas legaram-nos também uma crítica bem autorizada do texto, fazendo-nos saber que aqui ou ali uma palavra deve ser introduzida ou mudada ou posta de lado, mas toda essa crítica está colocada na margem. Sugerem a divisão correta das palavras – Salmos 55:26; 123:4, a transposição; alteração e omissão de consoantes: I Reis 7:45, Amós 8:8; a correta forma gramatical ou ortográfica – Ezequiel 27:5; explicações eufemísticas – I Samuel 5:6; Isaías 36:12.
O aparato crítico introduzido por eles é provavelmente o mais completo da sua espécie.
Embora todo a trabalho massorético fosse útil e importante, entre eles o que mais se destaca e o mais conhecido foi a criação de um sistema de sinais vocálicos que introduziram no texto consonantal para a correta pronúncia das palavras. As palavras de Merril Unger nos ajudam a compreender a importância desta contribuição:
“Antes das vogais serem adicionadas ao texto consonantal no 7º século de nossa era, a vocalização era inconstante, variando consideravelmente através dos séculos e em vários países. Um texto vocalizado é muito mais fácil de ser lido e muito menos passível de variações em sua pronúncia. Em certo número de casos, por exemplo a LXX e outras versões antigas leram as consoantes do texto, mas vocalizaram-nas diferentemente.”
Os massoretas inventaram um sistema de 10 sinais com variação para as vogais, a, e, i, o, u. O objetivo destes sinais era preservar a pronúncia do texto, pois como já foi dito, o hebraico já era neste tempo língua morta. A pronúncia por eles conservada era a de seu tempo, porque sabemos que algumas pronúncias originais eram diferentes: Nabucodonosor, era Nabuchuduriza, Melquisedeque era Melquisaducu.
Além das vogais criaram um sistema complicado de acentos, 21 para as seções da prosa e 27 outros para as seções poéticas.
Os livros que estudam o trabalho dos massoretas ainda nos dizem que havia:
1) A Massora Inicial – Um estudo da palavra inicial do livro, que sempre era usada como título para o livro.
2) A Massora Pequena – Eram os comentários que se encontravam nas margens laterais.
3) A Massora Grande – Comentários colocados nas partes posteriores e inferiores da página.
4) A Massora Final – como o nome indica, era posta no final do livro, contendo, especialmente, dados estatísticos para o copista, como número de letras e palavras daquele livro, a palavra medial, etc.
Apesar do trabalho dos massoretas ser bastante cuidadoso, nem todos os manuscritos foram copiados com tal esmero e exatidão, como é visto no capítulo “Causas dos Erros na Transmissão do Texto Bíblico”. Em conseqüência nem todas as cópias sagradas do original são exatamente iguais, há muitas variações dos manuscritos, que dificultam bastante o trabalho dos tradutores. Apesar destas variações, o trabalho da Crítica Textual tem sido tão eficiente na reconstrução do original, que na essência o texto da Bíblia não sofreu nenhuma alteração.
Pedro Apolinário, História do Texto Bíblico, Capítulo 12.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Famílias dos Manuscritos


Para auxiliar a sua leitura os manuscritos foram dispostos em grupos ou famílias, considerando-se as características semelhantes ou diferentes que apresentavam.


Esta classificação foi feita após uma cuidadosa comparação de centenas de manuscritos. Hoje sabemos que cada uma dessas famílias é representada por um manuscrito “padrão”, preparado numa sede eclesiástica importante da antiguidade, como Alexandria, Cesaréia, Antioquia e Roma.


O procedimento seguido era este: os bispos dirigentes das sedes reuniam os manuscritos à sua disposição, pediam emprestados todos os manuscritos que pudessem conseguir, estudavam-nos minuciosamente, resultando daí o manuscrito padrão.


O termo técnico para o exame do material de que dispunham e o conseqüente agrupamento em famílias é recensão.


O objetivo primordial desta classificação era descobrir os manuscritos mais antigos, porque mais se deveriam assemelhar aos originais. O precursor da classificação em famílias, ou do método genealógico foi o erudito alemão Karl Lachmann (1793-1851), que nos ensinou o seguinte princípio: o melhor método para descobrir o texto bíblico é traçar sua árvore genealógica através da qual atingiremos seu arquétipo.


Destas classificações em famílias, a de Westcott e Hort é uma das mais conhecidas e discutidas. A classificação destes eruditos é a seguinte:


a) Texto Siríaco


O nome siríaco deriva-se da conclusão de que na Síria, provavelmente em Antioquia, uma revisão textual se processou durante a primeira metade do 4º século. Esta revisão se fez necessária, porque o texto já apresentava muitas variantes e a Igreja ardentemente almejava uniformidade nas Escrituras.


Neste grupo está a maioria dos manuscritos gregos do Novo Testamento, sendo muitos unciais do V século e quase todos os minúsculos.


b) Texto Ocidental


Assim denominado porque suas mais influentes evidências são predominantemente latinas. Tem como característica preponderante divergir das outras famílias.


Ao contrário do siríaco, neste grupo se encontra um pequeno grupo de manuscritos, sendo liderado pelo Códice Beza ou D. Fazem também parte dele antigas traduções latinas e Pais da Igreja latinos, como Cipriano, Irineu e Tertuliano.


c) Texto Alexandrino


Também formado por pequeno grupo de manuscritos que não puderam ser colocados nas outras classes por eles apresentadas.


d) Texto Neutro


Para Westcott e Hort sob este nome se encontram os dois principais manuscritos, isto é, o a = alef e o B.


De acordo com o conceito destes eruditos, era o melhor texto por ser o mais primitivo e ter sido transmitido com pureza de forma. Denominaram-no de Neutro por não se desviar na direção seguida pelos outros grupos.


As idéias de W. H. marcaram época, e os princípios por eles defendidos ainda são válidos, mas o progresso da Crítica Textual e a descoberta de novos manuscritos mostraram a necessidade de revisão em seus métodos.


Quem se interessar por um conhecimento mais completo da teoria de Westcott e Hort deve estudar nas obras especializadas em Crítica Textual ou em Introduções ao Novo Testamento, como a de Everett F. Harrison, páginas 71 a 74.


A classificação mais usada e aceita por todos hoje pouco difere da de W. H. Ao estudá-la observe seus pontos afins e suas divergências.


a) Texto Bizantino


É conhecido como Asiático por Bengel, Constantinopolitano por Griesbach, Siríaco, por W. H., oriental por Semler e K por Von Soden.


O chefe da recensão deste tipo de texto foi Luciano. Trabalho feito nos últimos anos do século terceiro, levando-se em conta que foi martirizado em 312, por ordem do imperador Maximino. O principal objetivo desta recensão foi fundir passagens paralelas para que nada se perdesse do texto sagrado e aclarar o texto, fazendo com que passagens difíceis se tornassem mais fáceis. Como um exemplo da fusão de variantes pode ser citado Lucas 24:53, que aparece em alguns manuscritos – “e estavam sempre no templo louvando a Deus”, mas em outros se encontra – “orando a Deus”. O texto bizantino reuniu as duas expressões, aparecendo: “e estavam sempre no templo louvando e orando a Deus”.


Este é o texto da grande quantidade de unciais e cursivos. Nele está baseado o Novo Testamento de Erasmo, o Textual Receptus e todas as edições do Novo Testamento anteriores à de W. H. em 1881. Dentre seus unciais destacam-se A, E, L, F e o W.


O Bizantino tem sido classificado pelos entendidos como bastante deficiente.


b) Texto Ocidental


Recebe este nome por ser representado pelo códice Beza, Greco-latino D, e pela velha Versão Latina.


A característica deste texto, é a divergência sensível que se nota ao compará-lo com outros grupos.


São seus principais representantes: D, DP, F, P29, P48, 171, Velha Latina.


Preeminentes vultos da Crítica Textual considerando a falta de homogeneidade do Texto Ocidental afirmam que nele não se processou nenhuma recensão, embora Ropes e Hatch afirmam ser ele o resultado de uma recensão.


c) Texto Alexandrino


Westcott e Hort o denominaram de Neutro, e Von Soden de H (Hesiquiano). O grupo consta especialmente dos manuscritos: alef, B, P 75 e 33.


Como o nome indica, teve a sua origem no Egito, na famosa cidade de Alexandria, um dos principais centros de cultura na antiguidade. É o produto da mais aprimorada e minuciosa recensão já efetuada no texto bíblico. Este trabalho foi dirigido por Hesíquio, com uma técnica bastante adiantada.


d) Texto Cesareense


 O nome cesareense não indica que teve sua origem em Cesaréia, pois a crítica textual comprova sua origem no Egito. Cesareense vem da circunstância de ser o tipo de texto usado em Cesaréia.


O manuscrito padrão deste grupo é o Coridete ou B. Apresentam características semelhantes ao Coridete as Famílias 1 e 13 dos minúsculos.


A recensão do tipo cesareense de texto tem sido atribuída a Panfílio, grande admirador de Orígenes, que por defender a multiplicação das cópias das Escrituras foi martirizado em 309.


Este estudo é difícil, complexo, e mesmo as idéias apresentadas foram simplificadas, para que até pessoas não muito relacionadas com a Crítica Textual o pudessem compreender razoavelmente.


O agrupamento de manuscritos em famílias simplificou bastante o trabalho da Crítica Textual, que não se baseia mais no número de manuscritos, mas no número de famílias e suas características predominantes. É muito mais fácil e apresenta melhores resultados consultar cinco manuscritos de famílias diferentes do que uma centena pertencentes à mesma família.


O texto perfeito, ideal, ainda não foi encontrado, os problemas vão sendo superados e os esforços de muitos denodados trabalhadores, neste campo, merecem nosso respeito e consideração.


Texto de Pedro Apolinário, História do Texto Bíblico, Capítulo 11.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Métodos da Crítica Textual


Crítica Textual pode ser definida como a disciplina que procura restaurar o texto original de um documento, que foi alterado no processo de cópia e recópia.


Mesmo com os métodos modernos de impressão, onde revisões e leitura de provas reduzem ao mínimo os erros, freqüentemente estes aparecem.


Antes da invenção da imprensa, quando qualquer cópia de um documento tinha que ser feita, à mão, os erros eram muito mais comuns. Quando existe o autógrafo, torna-se fácil a correção, comparando-se a cópia ou cópias com o original.


É do conhecimento geral que os autógrafos bíblicos não mais existem e também as cópias diferem entre si em muitos pormenores. Pode-se afirmar, sem receio de contestação, que a tarefa de reconstituir o texto original, em toda a sua perfeição é humanamente impossível.


A Crítica Textual é uma disciplina bastante antiga, pois a História nos relata que em 274 a.C. Zenodato de Éfeso fez uma comparação de muitos manuscritos da Ilíada e da Odisséia com a finalidade de restaurar o texto original.


No fim do segundo século da nossa era, Teodato e seus companheiros empreenderam uma obra de recensão crítica do texto bíblico. Não muito distante de Teodato, um dos maiores intelectuais do seu tempo, Orígenes de Alexandria, começou um estudo crítico de todo o Antigo Testamento em hebraico e de diversas traduções gregas. Sua monumental obra – a Hexapla – foi durante muitos anos consultada por intelectuais da Patrística na Biblioteca de Cesaréia, até sua destruição no sétimo século pelas hordas islâmicas. O trabalho de crítica textual, levado a efeito por Orígenes, encontra-se abundantemente exemplificado em obras estrangeiras especializadas nesta disciplina.


Apenas duas rápidas referências ao seu trabalho neste campo:


1ª) Alguns poucos manuscritos como o Y teta e o C trazem a variante Jesus Barrabás para Mateus 27:16, enquanto quase a totalidade dos unciais e a maioria dos minúsculos trazem simplesmente Barrabás. Orígenes rejeitou a variante Jesus Barrabás em defesa da simples forma Barrabás, justificando que o nome Jesus não podia ser aplicado a alguém que praticasse o mal. Este argumento não me parece de muito peso.


2ª) Em João 1:28 aparece outra variante: Betânia e Betábara. A crítica textual crê que a forma primitiva era Betânia, mas algum copista achando difícil a harmonização geográfica alterou para Betábara. Orígenes defendeu para o lugar de batismo de João, Betábara, fundamentando-se na geografia e na etimologia. O manuscrito sinaítico e a King James trazem Betábara. Vincent em “Word Studies in the New Testament” diz que a correta variante é Betânia, não a Betânia de João 11:18, mas uma desconhecida vila, acrescentando que era comum dois lugares terem o mesmo nome, como as duas Betsaidas (Mar. 6:45; João 1:44); duas Cesaréias (Mat. 16:13; Atos 8:40), as duas Antioquias, uma na Síria e a outra na Pisídia.


São  Jerônimo


Julgando de acordo com os padrões modernos, São Jerônimo (347-420), foi um crítico textual mais sagaz do que Orígenes, bem cônscio das variantes de erros que aparecem na transcrição de manuscritos. Ele se refere, por exemplo, à possibilidade da confusão de letras semelhantes, confusão de abreviações, acidentes envolvendo haplologia, metátese, assimilação, transposição e até deliberadas emendas dos copistas.


Em cartas a monges e no Prefácio da sua revisão dos Evangelhos há diversas referências que provam o seu profundo interesse na crítica textual. Por exemplo, em carta a dois monges que lhe pediram explicações de diversas passagens da Bíblia, ele discute diversas formas do texto de I Cor. 15:51, indicando que preferia a variante: “Todos dormiremos, mas nem todos seremos transformados”.


Olhando para o aparato crítico de um Novo Testamento grego inteiramo-nos de que assiste razão a São Jerônimo, porque o manuscrito sinaítico e alguns outros trazem: “Todos dormiremos, nem todos seremos transformados”. O problema principal com este verso parece ser este: a ordem diferente das palavras na frase altera o seu sentido.


Santo  Agostinho (354-430)


Mostrou apreciável perspicácia crítica, no julgamento de problemas textuais. Um dos problemas estudados por ele se encontra em Mateus 27:9. Há aqui uma citação atribuída a Jeremias, quando na realidade é de Zacarias. Santo Agostinho sugere que deveria ser notado o seguinte: a atribuição da passagem a Jeremias não se encontra em todos os manuscritos dos Evangelhos, pois alguns trazem simplesmente: foi dito por intermédio do profeta. Os manuscritos que não contêm o nome do profeta, talvez fossem copiados de outros onde o nome de Jeremias se encontrava, mas os copistas o eliminaram, pensando que desta maneira solucionariam o problema. Um estudo mais aprofundado dos manuscritos gregos nos mostra que o nome de Jeremias aparece nos principais e mais antigos códices.


O trabalho da Critica dos textos bíblicos sempre prosseguiu com maior ou menor intensidade, porém, o ponto de partida da moderna Crítica Textual foi a edição de Westcott e Hort em 1881, a qual foi precedida de numerosos trabalhos, entre eles destacando-se os de Tischendorf.


Alta  e  Baixa  Crítica


Antes de prosseguir seria útil saber que há duas espécies de crítica bíblica: Alta Crítica e Baixa Crítica.


A Alta Critica preocupa-se em estudar o autor do livro, tempo, lugar e circunstâncias em que ele foi escrito, sua validade histórica, etc. A expressão “Alta Crítica” tem dado motivo a objeções, por parecer indicar algo de superioridade, achando alguns que uma designação mais própria seria “Crítica Histórica”.


A Baixa Crítica estuda a linguagem (vocabulário, questões de gramática), a história da transmissão do texto, incluindo as tentativas para restaurar o texto do autógrafo original. Este estudo é chamado de Crítica Textual.


O material com que trabalham os críticos textuais da Bíblia inclui não somente as cópias dos manuscritos nas línguas originais, mas também antigas traduções e citações da  Bíblia pelos Pais da Igreja. O conjunto destes materiais chama-se em Crítica Textual “testemunhas”.


Quando os manuscritos que contêm a Bíblia no idioma original diferem entre si em algum pormenor, o modo diferente que aparece em cada manuscrito chama-se “variante”. A finalidade primordial da Crítica Textual seria determinar que “variante” tem mais possibilidade de ser a original.


O trabalho da Crítica Textual requer muita perícia e técnica especializada que deve ser conquistada com muito esforço.


Para chegar a um bom fim, o crítico, entre outras coisas, deve saber:


a) Paleografia – A ciência da escrita antiga;


b) A técnica da recensão – comparação entre os manuscritos;


c) Ser perito em “Examinatio” – o processo de seleção das “variantes” nos manuscritos.


Como proceder a uma escolha judiciosa dentre as variantes?


Para fazer esta distinção, a crítica dispõe de dois critérios diferentes, embora necessariamente simultâneos e interdependentes: a Crítica Externa e a Crítica Interna. Estes Critérios são também denominados: Evidências Externa e Evidência Interna.


Evidência  Externa


Envolve considerações como:


1º) A idade do manuscrito. Quanto mais Antigo é o documento, menos viciado ele deve estar pelos copistas. Pode também acontecer que manuscritos modernos sejam cópias de outros antiqüíssimos que desapareceram. Um manuscrito do VI século pode ter sido copiado dum manuscrito do IV século.


2º) A família a que o manuscrito pertence. Os manuscritos e versões foram classificados em grupos para facilitar a sua leitura e interpretação.


O mais importante na crítica textual externa é reconstituir, tanto quanto possível, a história dos diferentes estados do texto, agrupando os documentos semelhantes e procurando saber porque se teriam tornado diferentes. É um trabalho difícil, porque não foi possível ainda reunir todos os documentos necessários para se chegar a uma conclusão satisfatória.


3º) O número de manuscritos que apresentam a variante. Este número tem um valor relativo, desde que o princípio clássico “non numerantur sed ponderantur” não pode ser esquecido.


Evidência  Interna


Esta procura precisa o valor dos textos através do seu conteúdo, envolvendo o que Hort designou: probabilidade transcricional.


A probabilidade intrínseca procura descobrir o que o autor mais provavelmente teria escrito, considerando:


1º) Seu estilo e vocabulário através do livro;


2º) O contexto;


3º) Harmonia com o uso do autor em outros lugares nos Evangelhos;


4º) Sempre considerar a base aramaica do ensino de Jesus;


5º) Não esquecer, advertem os entendidos, a precedência do Evangelho de Marcos.


A probabilidade transcricional, conhecendo os problemas enfrentados pelos copistas, estabeleceu as seguintes premissas:


1ª) A mais difícil variante deve ser preferida. Pela regra de Bengel “Proclivi scriptioni praestat ardua”, a tendência do copista era sempre simplificar e nunca acrescentar uma dificuldade;


2ª) Em geral uma variante mais curta deve ser preferida a uma mais longa;


3ª) Textos divergentes devem ser preferidos, porque a tendência dos copistas, era harmonizar passagens paralelas em desacordo;


4ª) Se o texto revelar aperfeiçoamento estilístico, não deve ser autêntico;


5ª) Ter sempre em mente a destacada influência da igreja primitiva sobre os copistas.


Além destas evidências externas e internas, o crítico textual não pode olvidar este princípio fundamental.


O principal critério para a avaliação de diferenças textuais é este: “escolher a variante que melhor explique a origem das outras”. Quando há duas variantes, igualmente sustentadas por provas externas, a mais provável é a que melhor se adapta ao sentido.


O conselho de Lake é bastante oportuno para aquele que se dedica à critica textual: “O crítico deve estar sempre pronto para revisar seu julgamento. Deve sempre suspeitar ainda mais de suas próprias conclusões.


A seguir, encontram-se três aplicações das regras aqui apresentadas; sendo as duas primeiras fornecidas por Joseph Angus em História, Doutrina e Interpretação da Bíblia, vol. 1, cap. IV, e a terceira, uma tentativa de aplicar o método e historiar a doxologia do Pai Nosso.


AS  TRÊS  TESTEMUNHAS  CELESTIAIS  EM  1 JOÃO 5:7


A passagem se encontra nas edições Clementinas da Vulgata, na Poliglota Complutensiana, e na terceira edição de Erasmo, por isso ela aparece também nos textos de Estêvão, Beza e Elzevir.


Contra sua legitimidade pode dizer-se:


a) Nenhum manuscrito grego de data anterior ao século XV a contém. Não vem em muitos manuscritos cursivos e no a A, B, etc.


b) Falta em todas as antigas versões, exceto na latina.


c) Os antigos Pais da Igreja nunca a citaram em qualquer dos seus argumentos a favor da doutrina da Trindade. Os versos 6, 8 e 9 são mais de uma vez citados, mas nunca o verso 7.


Em favor de sua legitimidade pode ser dito:


a) A passagem existe em alguns manuscritos gregos cursivos, no Códice Raviano de Berlim, no Códice Ottobiano do Vaticano, no Códice Regius de Nápoles e no Montfortianus de Dublin, devendo contudo observar-se que o primeiro é uma cópia do Complutensiano, o segundo é simplesmente uma tradução da Vulgata, e o terceiro conserva-se somente na margem. O quarto pertence ao século XV, ou é posterior.


b) Acha-se num manuscrito de extratos do Velho Latim (Speculum), pertencente ao sexto ou sétimo século.


c) É citada por Virgilius de Thapsus pelos fins do quinto século e também na Confissão de Fé que um grupo de cristãos, apresentou em 484 AD, e que pertence à história das perseguições dos vândalos na África.


d) Estas palavras são exigidas pela construção e conexão do texto.


A opinião geral dos intérpretes da Bíblia é assim expressa pelo Dr. Scrivener:


“Não hesitamos em declarar nossa convicção de que as palavras em questão não foram escritas pelo autor da Epístola de São João; mas que foram colocadas como piedosa e ortodoxa anotação na margem do verso oito, depois foram desta transportadas para o texto nos exemplares latinos da África, e do latim passaram para dois ou três códices gregos, penetrando depois no texto primitivo, lugar que não lhes pertence por legítimo direito.”


O  PROBLEMA  DE  UMA  EXPRESSÃO  EM  LUCAS 6:1


Depois da palavra sábado em Lucas 6:1 o “Textus Receptus”, e muitas traduções modernas trazem a expressão “o segundo-primeiro”. Sendo que esta expressão não aparece em outra parte, tem sido um problema exegético de difícil solução. Em virtude da palavra não constar nos melhores manuscritos, poder-se-ia afirmar que ela não se encontra no original, não fosse a suspeita de que algum copista a tivesse omitido por causa da sua obscuridade.


O principio da probabilidade transcricional torna necessário explicar a sua inserção, se não é genuína. Meyer engenhosamente sugere que a palavra é simplesmente a fusão de duas notas marginais, opinião esta que foi adotada por W. H. e outros. Como no versículo 6, está a expressão “noutro” (heteros) sábado, algum escriba pôs à margem no verso primeiro a nota “num primeiro” (proto). Mas a recordação de diversos incidentes, que se tinham dado em sábados anteriores, levou outro copista a fazer uma correção “num segundo” (deuteros) sobre a (deuteroproto) que algum copista posterior intercalou no texto para confusão dos comentadores. Ou seja assim, ou não, o fato esclarece uma deturpação do texto original.


A  DOXOLOGIA  DO  PAI  NOSSO


Se Jesus tivesse concluído Sua oração com a doxologia não haveria necessidade deste estudo, mas a realidade parece ser bem diferente.


Como é do conhecimento de todos os estudiosos dos problemas do texto bíblico, a grande maioria dos manuscritos e das antigas versões não trazem esta parte do Pai Nosso. Portanto, cabe à crítica textual explicar como ela apareceu, ou provar a sua autenticidade.


Sabemos que não é fácil desarraigar um hábito de muitos anos, mas porque a verdade precisa ser conhecida, o assunto será tratado realisticamente, embora com a dignidade e respeito que as palavras merecem, em face do uso que delas fazemos. A doxologia nos é tão familiar e agradável, embelezando tanto o final desta oração, que apenas discutir a sua omissão poderá parecer sacrilégio para alguns.


Que diz a Crítica Textual sobre este problema?


Os principais manuscritos das famílias Ocidental e Alexandrina a omitem, embora apareça nas famílias Cesareense e Bizantina por se caracterizarem pelo polimento e aperfeiçoamento do estilo, não apresentam o mesmo peso em evidências textuais. Sendo a doxologia um polimento que aformoseia o Pai Nosso, não merece muito crédito o seu aparecimento nas citadas famílias.


Dos 250 manuscritos unciais apenas seis registram a doxologia, sendo eles: o Teta ou Coridete, o W, que se encontra em Washington, o K e o L de Paris, o Delta e o PI. Dos 2.646 manuscritos minúsculos ela aparece em mais ou menos uns 20. Alguns manuscritos trazem a doxologia em sua forma reduzida e ainda outros com redação alterada.


A doxologia não aparece nos Pais da Igreja (excetuando-se Crisóstomo e seus discípulos).


Todos os grandes vultos que se dedicaram ao estudo da Crítica Textual concluem que esta parte não pertence ao escrito original de Mateus.


O Comentário Bíblico Adventista diz:


“Importante evidência textual pode ser citada para a omissão desta doxologia. . . . Contudo, o sentimento que ela expressa é escriturístico, intimamente relacionado com I Crônicas 29:11-13.”


Diante destas evidências a conclusão apenas deve ser esta: Sendo que o texto grego termina com a palavra poneros = mal, a doxologia deve ser suprimida da Bíblia, como fazem as Bíblias Católicas.


Como a doxologia achou seu caminho para o texto bíblico?


A doxologia surgiu quando algum copista achou que o Pai Nosso precisava de um acréscimo litúrgico ou pela observação de que as outras orações terminavam com uma doxologia.


Este término produz em nós a impressão de um mais completo ato de adoração.


Deixando de lado o aspecto científico e dando apenas vazão à afetividade poderíamos concluir como fez o prof. Aécio Cairus do Colégio Adventista do Prata:


“De qualquer modo, não há porque interromper o costume de usar estas formosas palavras quando oramos. O comentário ou utilização que delas fazem a Sra. White, só garantem a sanidade e veracidade declarativas – não a origem ou canonicidade, a menos que queiramos canonizar também os escritos pagãos que Paulo cita para exemplo. Mas nos dão razão de sobra para utilizar a formosa doxologia sem a qual para os que estamos habituados a ouvi-la, o Pai Nosso perderia algo de sua sonoridade.” (O Ministério Adventista, janeiro e fevereiro de 1975, p. 16).


Texto de Pedro Apolinário, História do Texto Bíblico, Capítulo 10.

Nomes para a Palavra de Deus


I. Bíblia - A palavra Bíblia, usada com referência às Escrituras Sagradas desde o IV século, é a forma latina da palavra grega Bíblia, plural neutro de Biblion, que por sua vez é diminutivo de Biblos – nome grego para a planta da qual se fazia o papel – papiro. Pelo uso que se fez do papiro é que biblos veio a significar livro e biblion um livro pequeno.


Os fenícios se ocupavam grandemente do comércio de papiro, por isso no segundo século a.C. deram o nome de Biblos ao seu principal porto, passando depois à cidade, e conservado até hoje para as suas ruínas. A palavra Biblos encontra-se em Marcos 12:26 como referência a um livro de Velho Testamento, ou a um grupo no plural para designar os livros dos profetas – Daniel 9:2. O plural usado no Velho Testamento passou à Igreja Cristã e as Escrituras são designadas por livros, livros divinos, livros canônicos.


O nome Bíblia para o conjunto dos livros sagrados, foi usado pela primeira vez por Crisóstomo, no IV século.


Alguns pais da Igreja denominaram as Escrituras de Biblioteca Divina.


II. Escrituras - O Novo Testamento, que ocupa menos da terceira parte do Velho, usa a expressão – Os Escritos ou as Escrituras para os livros do Antigo Testamento, em Mateus 21:42 e João 5:39.


III. Outras Expressões


1. Nomes Técnicos:


a) A Palavra de Deus – Heb. 4: 12
b) A Escritura de Deus – Êxo. 32:16
c) As Sagradas Letras – II Tim. 3:15
d) A Escritura da Verdade – Dan. 10:21
e) As Palavras da Vida – Atos 7:38
f) As Santas Escrituras – Rom. 1:2


2. Nomes figurativos:


a) Uma luz. “Uma luz para o meu caminho.” Sal. 119:105.
b) Um espelho – Tiago 1:23
c) Ouro fino – Sal. 19:10
d) Uma porção de alimento – Jó 23:12. Leite – I Cor. 3:2. Pão para os famintos – Deut. 8:3
e) Fogo – Jer. 23:29
f) Um martelo – Jer. 23:29
g) Uma espada do Espírito – Ef. 6:17


IV. Pentateuco - Etimologicamente, Pentateuco significa cinco estantes, onde se colocavam os livros e depois, por metonímia, os próprios livros. Pesquisando um pouco mais tem-se a impressão de que as estantes eram aqueles pedaços de madeira que sustentavam os rolos, vindo depois a designar os próprios rolos.


O termo pentateuco, de origem grega, significando cinco rolos tem sido usado para os cinco livros de Moisés, enquanto o nome hebraico para estes mesmos livros é Torá. Este vocábulo começou a ser usado para os primeiros cinco livros da Bíblia depois da tradução da Septuaginta.


Estes livros constituem a primeira divisão do Cânon Hebraico, que é formado, como é do conhecimento geral, da Lei, dos Profetas e dos Escritos.


Eruditos modernos têm usado o termo “Hexateuco” em vez de Pentateuco, por adicionarem aos primeiros livros da Bíblia o livro de Josué, por notarem muita afinidade entre os seis. Nenhuma razão plausível existe para a aceitação desta nova nomenclatura, desde que o termo tem sido usado por críticos que não admitem tenha sido Moisés o autor do Pentateuco.


V. Testamento - Este vocábulo não se encontra na Bíblia como designação de uma de suas partes. Sabemos que toda a Bíblia se divide em duas partes chamadas Antigo Testamento e Novo Testamento; contendo a primeira, os escritos elaborados antes de Cristo, a segunda registra o que foi redigido no primeiro século da nossa era.


A palavra portuguesa testamento corresponde à palavra hebraica “berith” – aliança, pacto, contrato, e designa aquela aliança que Deus fez com o povo de Israel no Monte Sinai, aliança sancionada com o sangue do sacrifício como vemos em Êxodo 24:1-8; 34:10-28. Sendo esta aliança quebrada pela infidelidade do povo, Deus prometeu uma nova aliança (Jer. 31:31-34) que deveria ser ratificada com o sangue de Cristo. (Mat. 26:28). Os escritores neotestamentários denominam a primeira aliança de antiga (Heb. 8:13), contrapondo-lhe a nova. (II Cor. 3:6, 14).


Os tradutores da Septuaginta traduziram “berith” para “diatheke”, embora não haja perfeita correspondência entre as palavras, desde que berith designa aliança (compromisso bilateral) e diatheke tem o sentido de “última disposição dos próprios bens”, “testamento” (compromisso unilateral).


Pela figura de linguagem, conhecida como metonímia, as respectivas expressões “antiga aliança” e “nova aliança” passaram a designar a coleção dos escritos que contém os documentos respectivamente da primeira e da segunda aliança.


O termo testamento veio até nós através do latim quando a primeira versão latina do Velho Testamento grego traduziu diatheke por testamentum. São Jerônimo revisando esta versão latina manteve a palavra “testamentum”, eqüivalendo ao hebraico “berith” – aliança, concerto, quando a palavra como já foi visto não tinha essa significação no grego. Afirmam alguns pesquisadores que a palavra grega para contrato, aliança deveria ser suntheke, por traduzir melhor o hebraico “berith”.


As denominações Antigo Testamento e Novo Testamento, para as duas coleções dos livros sagrados, começaram a ser usadas no final do II século AD, quando os evangelhos e outros escritos apostólicos foram considerados como Escrituras.


O cristianismo distinguiu duas etapas na manifestação do dom de Deus à humanidade:


1ª) A antiga – feita por Deus ao povo de Israel. II Cor. 3:14.
2ª) A segunda ou nova designa a união que o próprio Deus, tomando a forma humana, selou com o homem pela oblação de Cristo. II Cor. 3:6.


VI. Torah - Palavra derivada do verbo Yarah, que no “hifil” significa lançar, jogar (Êxo. 15:4, I Sam. 20:36) e de modo especial lançar flechas para se conhecer a vontade divina (Jos. 18:6; II Reis 13:17). O mesmo verbo é usado no sentido de mostrar com a mão, apontar com o dedo (Gên. 46:28; Êxo. 15:25). A significação fundamental de yarah é, portanto; indicar uma direção. O substantivo cognato tem o sentido bíblico mais corrente: ensinamento, instrução, como se deduz da leitura de Isaías 30:9, 42:4; Miquéias 4:2; Malaquias 2:6; Jó 22:22, onde esta palavra aparece.


Do estudo desta palavra conclui-se que o termo português “lei” não traduz o vocábulo hebraico em toda a sua extensão. A torah é o ensinamento que inspira bom procedimento em nosso viver.


VII. Nomes dos Livros da Bíblia - Estes nomes são de origem hebraica, grega e latina.


Os nomes pelos quais são conhecidos, hoje, os livros da Bíblia vêm da Septuaginta (tradução do hebraico para o grego feita no III século a.C.), por isso muitos deles são gregos.


Os títulos foram dados levando-se em consideração duas coisas: a matéria principal contida no livro e os nomes já usados pelos hebreus alexandrinos.


Os judeus designavam os livros do Antigo Testamento pelas primeiras palavras com que se iniciavam.


a) Gênesis - Em grego origem, pois ali é revelada a origem do mundo, do homem e do povo hebreu. Os judeus o chamavam de “bereshith” = no princípio. Gênesis em hebraico seria toledoth, do verbo hebraico yalah, que significa gerar.


b) Êxodo - Palavra grega formada da preposição ec, denotando separação e ódos = caminho. Êxodo portanto significa saída, caminho para fora. É a história da saída do povo de Israel do Egito. Os hebreus o chamavam de Vele semoth = eis aqui os nomes.


c) Levítico - Do grego leviticon, por ser escrito para a tribo de Levi. São leis para os sacerdotes da tribo de Levi. O título hebraico tirado das primeiras palavras do livro é vaiicra = e Ele chamou.


d) Números - O nome Números provém da Vulgata (Numeri), que é a tradução do grego Arithmoi. Os judeus o denominavam de bam ebbar = e falou. O nome números foi dado por causa dos dois recenseamentos do povo de Israel, mencionados no livro.


e) Deuteronômio - Palavra grega composta de deuteros – segunda e nomos – lei. Foi assim denominado porque as leis do livro de Êxodo aparecem aqui repetidas.


f) Crônicas - Do grego chronos = tempo. Narrações históricas segundo a ordem do tempo. Na Bíblia hebraica as Crônicas formavam um só volume com o título de divere haiamim, isto é, “acontecimentos diários”.


Os tradutores da Septuaginta dividiram o livro em dois, denominando-os de Paraleipómenas, que quer dizer “coisas omitidas ou esquecidas”, recebendo este nome porque neles se narram fatos omitidos em Samuel e Reis. A tradução de Figueiredo, em português, conservou o nome Paralipômenos.


O nome Crônicas foi dado por São Jerônimo, na Vulgata.


g) Ester - Nome da principal personagem do livro. Palavra persa que significa estrela. O nome hebraico é “Hadhassah”.


h) Salmos - Ignora-se o nome com que os hebreus designavam esta coleção. Modernamente, na Bíblia hebraica aparecem sob a designação de Thehilim – os louvores. Os setenta o denominaram de Salmos, palavra grega, derivada do verbo “psallo”, que significa tocar instrumentos de corda.


i) Provérbios - Os judeus, denominando os livros pela palavra inicial, conheciam este pela designação de Mischele, termo derivado de maschal, que significa comparação, semelhança, e por extensão máxima, provérbio. Na Septuaginta, recebeu o título de Paromiai que quer dizer provérbios, comparações, parábolas.


O nome Provérbios se derivou da Vulgata, que lhe deu o nome de “Liber Proverbiorum”.


j) Eclesiastes - O título deste livro é tirado do nome que toma o autor “Koheleth”, cuja tradução grega é Eclesiastes, palavra que significa “aquele que fala a uma assembléia”.


O nome hebraico “Koheleth” derivado do verbo “kahal”, significa aquele que chama, convoca para instruir, especialmente com propósitos religiosos.


São Jerônimo, o erudito autor da Vulgata Latina, afirma que Eclesiastes significa no grego – aquele que reúne a congregação. Percebe-se logo que a palavra tem a mesma origem de ecclesia – igreja.


l) Cânticos dos Cânticos - O título hebraico do livro, formado pelas duas primeiras palavras, é shir hashirim, que traduzido em português é Cântico dos Cânticos.


Tem esse nome por ser o cântico por excelência, o mais belo dos cânticos. Segundo a Gramática Hebraica, de Gesenius, esta é uma das maneiras de construir o superlativo naquela língua. As construções – mestre dos mestres, senhor dos senhores, rei dos reis, tão usuais em português, são uma decisiva influência semítica através da Bíblia.


“A Septuaginta e a Vulgata adotaram o nome dado ao livro no “Cânon Hebraico”, mas algumas versões da Bíblia chamam-no ‘O Cântico de Salomão’ ou ‘Cantares de Salomão’. (Panorama do Velho Testamento, vol. 1, p. 153).


m) Apocalipse - É a transliteração da palavra grega, que se fosse traduzida seria revelação, como aparece em inglês.


O vocábulo foi formado dos seguintes elementos:


1º) Da preposição apó, que tem o sentido de separação de alguém ou de alguma coisa, como ilustram as palavras apogeu, apóstata, apóstolo, apócrifo, apoteose.


José Oiticica, no Livro Manual de Análise, pág. 110, escreveu: “Apó – fora de, idéia de afastamento, separação, movimento ou ação contrária à indicada pelo radical.” Apó tem portanto sentido negativo, equivalendo ao prefixo latino des.


2º) Calipsis – ação de ocultar, esconder, do verbo calipto – cobrir, esconder.


Do exposto acima conclui-se que: Apocalipse significa o que não deve estar escondido, aquilo que deve ser conhecido de todos.


Os outros nomes não foram estudados por não apresentarem o mesmo interesse.


Texto de Pedro Apolinário, História do Texto Bíblico, Capítulo 9.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Origem da Escrita – Livros Primitivos


Tem sido difícil determinar com exatidão, onde, como e quando a escrita teve a sua origem. A escrita se originou quando o ser humano sentiu a necessidade de guardar seus feitos para que a posteridade os conhecesse.


A escrita primitiva foi pictogrâmica onde figuras representavam objetos. Logo a seguir aparece a ideogrâmica, assim chamada pelo fato das figuras representarem idéias. Num terceiro estágio aparece o fonograma – figuras representando sons.


Dos povos antigos, os dois que mais se destacaram, no desenvolvimento da escrita, foram os babilônicos e os egípcios. Cada um destes teve a sua destacada e particular escrita: os babilônicos criaram a escrita cuneiforme, assim denominada por consistir de pequenas cunhas, feitas especialmente em pedras; enquanto os egípcios usavam pequenas figuras para representar objetos e idéias, os famosos hieróglifos. A história nos relata que a decifração dessas escritas exigiu muito esforço e concentração. A escrita cuneiforme foi decifrada pelo oficial inglês Henrique Rawlinson, após 18 anos de labores intensos. Quanto à escrita hieroglífica, todos sabem, que foi Champollion, o notável egiptólogo francês, o primeiro a desvendar-lhe os mistérios.


A Escrita Cuneiforme


“A princípio, certa espécie de marca representava uma palavra inteira, ou uma combinação de palavras. Desenvolvendo-se a arte de escrever, passou a haver ‘marcas’ que representavam partes de palavras, ou sílabas. Era este o gênero de escrita em uso na Babilônia no alvorecer do período histórico. Havia mais de 500 marcas diferentes, com umas 30.000 combinações. Geralmente, essas marcas se faziam em tijolos ou placas de barro macio (úmido), medindo de 2 a 50 centímetros de comprimento, uns dois terços de largura, e escritos de ambos os lados; depois eram secados ao sol ou cozidos no forno. Por meio dessas inscrições cuneiformes, em placas de barro, é que chegou até nós a vasta literatura dos primitivos babilônios.” (Manual Bíblico, p. 45).


Origem do Alfabeto


Tem sido um assunto bastante controvertido a origem do alfabeto. Em geral se aceita que o alfabeto de 22 letras foi inventado pelos fenícios e por eles levado aos gregos e depois aos latinos.


Até há pouco afirmava-se que a descoberta do alfabeto tinha sido pelos séculos XII ou XI A.C., sendo este argumento apresentado para provar que Moisés não podia ter escrito o Pentateuco, visto que em seu tempo não tinham ainda inventado a arte de escrever.


Ira M. Price no livro The Ancestry of Our English Bible, página 13, escreveu: “A escrita é muito antiga na Palestina. . . O trabalho dos arqueólogos nos mostra muitos exemplos de escrita antes de Moisés”.


Escavações arqueológicas em Ur têm provado que Abraão era cidadão de uma metrópole altamente civilizada. Nas escolas de Ur os meninos aprendiam leitura, escrita, aritmética e geografia.


Três alfabetos foram descobertos: junto do Sinai, em Biblos e em Ras Shamra, que são bem anteriores ao tempo de Moisés (1.500 A.C.). Estudiosos modernos, baseados em evidências irrefutáveis, sustentam que Moisés escolheu a escrita fonética para escrever o Pentateuco. O arqueólogo W. F. Albright datou esta escrita de início do século XV A.C. (tempo de Moisés). Interessante é notar que esta escrita foi encontrada no lugar onde Moisés recebeu a incumbência de escrever seus livros. Em Êxodo 17:14 encontramos a ordem divina para que Moisés escrevesse num livro.


Note-se ainda a frase de Merril Unger sobre a escrita do Antigo Testamento:


“A coisa importante é que Deus tinha uma língua alfabética simples, pronta para registrar a divina revelação, em vez do difícil e incômodo cuneiforme de Babilônia e Assíria, ou o complexo hieróglifo do Egito.”


Sobre o problema de Moisés ter escrito ou não seus livros vale acrescentar o que escreveu o Dr. Renato Oberg:


“Os primeiros livros da Bíblia a serem escritos foram os que compõem o Pentateuco e o de Jó, sendo a autoria deles atribuída a Moisés pela tradição judaica que, por sua vez, é aceita sem contestação por grande número de cristãos. O Talmude Babilônico afirma que ‘Moisés escreveu o seu próprio livro e as passagens a respeito de Balaão e Jó’. (SDABC, vol. III, p. 493).


Como vimos, nem todos aceitam Moisés como sendo o real autor destes livros, especialmente o de Jó. Os que o fazem, dão Jó como tendo sido o primeiro dos livros escritos, e Moisés o teria feito quando pastoreava os rebanhos do seu sogro nas campinas de Midiã, após ter fugido do Egito. Os cinco livros que compõem o Pentateuco foram escritos posteriormente. Os que não aceitam esta tese, já escreveram muito a respeito do assunto, procurando arrazoar com argumentos os mais variados, inclusive a diferença de estilo entre os livros e até dentro de cada um deles. . . .


Um dos argumentos mais fortes, porém senão o mais forte de todos, foi o que começou a dominar desde o fim do último quartel do século passado, quando Wellhausen, professor da Universidade de Greifswald, chegou a afirmar que se fosse tão-somente possível saber que Moisés pudesse escrever, seria ridículo não aceitá-lo. Evidentemente, segundo tudo o que se conhecia até então, quando as primeiras grandes descobertas arqueológicas começaram a empolgar o mundo e quando se dizia que tudo tem de ser decidido pela razão, tinha-se como certo que a invenção do nosso alfabeto se devia aos fenícios que o tinham criado no afã de facilitar suas transações comerciais pelo mundo todo. Foi então que a decifração dos hieróglifos feita por Champollion revelou o conteúdo de uma série enorme de documentos com sinais tidos por muitos como decoração e misticismo religioso, e cujo conteúdo era, até então, desconhecido completamente. Ora sendo o alfabeto inventado pelos fenícios, cuja existência foi bem posterior à de Moisés, e se as escritas anteriores, hieróglifos e cuneiformes, foram apenas decifradas no século passado, como poderia Moisés ter escrito aqueles livros? Se o tivesse feito, só o poderia fazer em hieróglifos, língua na qual a própria Bíblia diz que Moisés era perito (Atos 7:22) e, neste caso ela, a Bíblia do Velho Testamento, teria ficado desconhecida por nós até Champollion! Daí a frase de Wellhausen.


Acontece, porém, que no princípio do século XX ou, mais precisamente, nos anos de 1904 e 1905, Sir Flinders Petrie, fazendo escavações na Península do Sinai, patrocinadas pela Escola Britânica de Arqueologia no Egito, descobriu algumas inscrições muito diferentes do cuneiforme mas, embora aparentassem alguma semelhança com o hieróglifo, não o eram, em absoluto. O caso despertou enorme interesse entre os que cuidavam do assunto, especialmente quando começaram a aparecer mais vasos e óstracos (cacos de vasos com inscrições) portadores de sinais idênticos, em outros lugares na Palestina. Para encurtar a história, os estudos que arqueólogos famosos como, inclusive, W. F. Allbright fizeram, elucidaram completamente o caso e hoje se sabe perfeitamente que os sinais descobertos por Flinders Petrie pertencem à escrita chamada de proto-fenícia, proto-sinaítica ou cananita e . . . era alfabética! Com esta descoberta, a origem do nosso alfabeto se transportava da época dos fenícios para a dos seus antecessores, séculos antes, os cananitas que viveram no tempo de Moisés e antes dele. Foram estes antepassados dos Fenícios que simplificaram a escrita, passando a usar o alfabeto em lugar dos hieróglifos, isto é, sinais que representam sons ao invés de sinais que representam idéias. Para nós, porém, assume importância igualmente grande o fato de estes cananitas, inventores da escrita alfabética, serem justamente os da região onde Moisés pastoreava as ovelhas do seu sogro. Convém, portanto que os conheçamos um pouco mais.


A partir da XII dinastia, os egípcios começaram a explorar as minas de cobre e turquesa da região do Sinai, e uma das maiores delas ficava em Serabitel-Khaden, a cerca de oitenta quilômetros do tradicional Monte Sinai, onde foram dados os Dez Mandamentos. Em termos de jornada, esta região distava cerca de três dias de viagem do Egito. Neste local trabalhavam para os egípcios muitos semitas que praticavam uma religião muito semelhante à dos israelitas, tal como pôde ser observado pelos restos deixados por eles e descobertos pelos arqueólogos. Esta região era a mesma naquele tempo conhecida também pelo nome de ‘Terra de Midiã’, para onde Moisés fugiu da presença de Deus (Êxo. 2:15). Com estas descobertas, perderam sua razão de ser muitos dos argumentos contrários à Bíblia feitos pela Crítica Histórica, porque se verificou que a história bíblica daquele período passou a ser perfeitamente compreensível dentro dos costumes da época, inclusive a boa convivência de Moisés com o sacerdote Jetro, cujas religiões eram fundamentalmente as mesmas.


Ora vivendo Moisés quarenta anos nesta região, é óbvio que tomou contato com a escrita rude daquele povo, viu nela a escrita do futuro e passou a usá-la por duas grandes razões que teria julgado decisivas: a primeira foi a impressão grandiosa que teve de usar uma língua alfabética para seus escritos e que se compunha apenas de vinte e dois sinais bastante simples comparados com os ideográficos que aprendera nas Escolas do Egito; a outra teria sido o fato de compreender que estava escrevendo para seu próprio povo, cuja origem era semita como a dos habitantes da terra onde vivia, tendo estes uma religião idêntica à dos primeiros, ambas, porém, deturpadas pelas influências pagãs e oriundas do pecado; seus leitores seriam homens e mulheres, moços e moças do povo, especialmente israelitas que, não sendo versados em hieróglifos por causa da sua posição de escravos no Egito, aprenderam com muito mais facilidade os poucos e simples sinais alfabéticos que representavam sons do que os inúmeros e complicados hieróglifos que representavam idéias. . .


A frase de Wellhausen, se tida por verdadeira pelos seus discípulos antes das descobertas de Sir Flinders Petrie, deveria ser respeitada por eles mesmos depois delas, e seus seguidores deveriam passar a aceitar, sem mais contestações, a autoria mosaica destes livros.” (Revista Adventista, agosto de 1980, pp. 13 e 14).


Materiais Usados Para Escrever


Sendo que o papel só começou a ser usado na Europa por volta do décimo século A.D., antes disso eram usados os seguintes materiais para escrever: blocos de barro, ossos, pedras, tijolos de barro, couro, vários metais, tabuinhas cobertas de cera ou gesso, óstraco (cacos de vasos de barro), papiros e pergaminhos. Os museus do Velho Mundo estão repletos destes incipientes materiais de escrita. Dos escritos em blocos de pedra há documentos que se tornaram famosos pela antiguidade e conteúdo. Dentre estes se destacam: o Código de Hamurábi, a Pedra de Roseta, a Pedra Moabita e a Pedra de Siloé.


Seguem-se as sínteses dos dois mais famosos blocos de pedra apresentados por H. H. Halley em seu Manual Bíblico, pp. 50 a 54.


Código de Hamurabi


“Foi esta uma das mais importantes descobertas arqueológicas que já se fizeram. Hamurábi, rei da cidade de Babilônia, cuja data parece ser 1792-1750 a.C., é comumente identificado pelos assiriólogos com o “Anrafel” de Gên. 14, um dos reis que Abraão perseguiu para libertar Ló. Foi um dos maiores e mais célebres dos primitivos reis babilônios. Fez seus escribas coligir e codificar as leis do seu reino; e fez que estas se gravassem em pedras para serem erigidas nas principais cidades. Uma dessas pedras originalmente colocada na Babilônia, foi achada em 1902, nas ruínas de Susa (levada para lá por um rei elamita, que saqueara a cidade de Babilônia no século 12 a.C.) por uma expedição francesa dirigida por M. J. de Morgan. Acha-se hoje no Museu do Louvre, em Paris. Trata-se de um bloco lindamente polido de duro e negro diorito, de 2 m 60 cm de altura, 60 cm de largura, meio metro de espessura, um tanto oval na forma, belamente talhada nas quatro faces, com gravações cuneiformes da língua semito-babilônica (a mesma que Abraão falava). Consta de umas 4.000 linhas, equivalendo, quanto à matéria, ao volume médio de um livro da Bíblia; é a placa cuneiforme mais extensa que já se descobriu. Representa Hamurabi recebendo as leis das mãos do rei-sol Chamás: leis sobre o culto dos deuses dos templos, a administração da justiça, impostos, salários, juros, empréstimos de dinheiro, disputas sobre propriedades, casamento, sociedade comercial, trabalho em obras públicas, isenção de impostos, construção de canais, a manutenção dos mesmos, regulamento de passageiros e serviço de transporte pelos canais e em caravanas, comércio internacional e muitos outros assuntos.


Temos aí um livro, escrito em pedra, não uma cópia, mas o próprio autógrafo original, feito nos dias de Abraão, ainda existente hoje para testemunhar não só a favor de um sistema bem desenvolvido de jurisprudência, senão, também, do fato de que já nos dias de Abraão a capacidade literária do homem havia atingido um grau notável de adiantamento.”


A Pedra de Roseta


“É a chave da língua egípcia antiga. A língua da antigo Egito era hieroglífica, escrita de figuras, um símbolo para cada palavra. Pelo ano 700 a.C. uma forma mais simples de escrita entrou em uso, chamada ‘demótica’, mais aproximada do sistema alfabético, e que continuou como língua do povo até aos tempos dos romanos. No 5º século d.C. ambas caíram em desuso e foram esquecidas. De sorte que tais inscrições se tornaram ininteligíveis, até que se achou a chave de sua tradução. Essa chave foi a Pedra de Roseta.


Achou-a M. Boussard, um dos sábios franceses que acompanharam Napoleão ao Egito (1799), numa cidade sobre a foz mais ocidental do Nilo, chamada Roseta. Encontra-se hoje no Museu Britânico. É de granito negro, cerca de 1,30 m de altura, 80 cm de largura, 30 cm de espessura, com três inscrições, uma acima da outra, em grego, egípcio demótico, e egípcio hieroglífico, O grego era conhecido. Tratava-se de um decreto de Ptolomeu V, Epífanes, feito em 196 a.C. nas três línguas usadas então em todo o país, para ser colocado em várias cidades. Um sábio francês, de nome Champollion, depois de quatro anos (1818-22) de trabalho meticuloso e paciente, comparando os valores conhecidos das letras gregas com os caracteres egípcios desconhecidos, conseguiu deslindar os mistérios da língua egípcia antiga.”


Papiro


O papiro se destaca como o principal material antigo usado para escrever.


Planta originária do Egito, muito comum nas margens lodosas do Nilo, e usada abundantemente na preparação de uma espécie de papel. Ele só cresce em terrenos alagadiços, por isso em Jó 8:11 há a seguinte pergunta: Pode o papiro crescer sem lodo?


Normalmente se escrevia só de um lado do papiro e as folhas mais longas eram enroladas. Estes rolos recebiam o nome de volumes, palavra do latim – volvere que significa enrolar.


Os egípcios guardavam ciosamente o segredo da preparação do papiro para a escrita. No século VI a.C. começaram a exportá-lo para a Grécia e depois para outros povos que habitavam nas margens do Mediterrâneo, onde se criou um importante comércio desta especialidade, mormente na cidade da Biblos.


Quem hoje chega ao Cairo, capital do Egito, pode visitar, às margens do rio Nilo um navio-escola, onde se prepara o papiro com finalidades culturais e turísticas, mas não comerciais.


The Interpreter’s Dictionary of the Bible, vol. 3, p. 649, diz o seguinte sobre o papiro:


“O papel, palavra derivada de papiro, era preparado de finas faixas da parte interior da folha do papiro arranjadas verticalmente, com outra camada aplicada horizontalmente em cima. Um adesivo era empregado (Plínio diz que era água do Nilo!) e pressão aplicada para ligá-las formando uma folha. Após secar, era polida com instrumentos de concha ou pedra; depois as folhas eram atadas, formando rolos.”


Pergaminho


A preparação do pergaminho para receber a escrita tem uma interessante história. De acordo com a História Natural de Plínio, o Velho (Livro XIII, capítulo XXI), foi o rei Eumene de Pérgamo, uma cidade da Ásia Menor, quem promoveu a preparação e o uso do pergaminho. Este rei planejou fundar uma biblioteca em sua cidade, que se rivalizasse com a famosa biblioteca de Alexandria. Esta ambição não agradou a Ptolomeu do Egito, que imediatamente proibiu a exportação de papiro para Pérgamo. Esta proibição forçou Eumene a preparar peles de carneiro ou ovelha para receber a escrita, dando-lhe o nome do lugar de origem – pergaminho. O pergaminho era muito superior ao papiro, por causa da maior durabilidade. Os principais manuscritos bíblicos estão escritos em Pergaminhos. Paulo na sua II Epístola a Timóteo (4:13) roga ao jovem ministro para que lhe trouxesse os pergaminhos. Em grego a palavra não é pergaminho mas membrana.


O pergaminho continuou a ser usado até o fim da Idade Média quando o papel inventado pelos chineses e introduzido na Europa pelos comerciantes árabes tornou-se popular, suplantando todos os outros materiais da escrita. Os judeus eram bastante cuidadosos com a preparação de manuscritos destinados a receber os escritos sagrados, exigindo que a pele fosse de animal limpo e preparada por um judeu.


Palimpsesto


Em virtude de crises econômicas o pergaminho tornava-se muito caro, era então raspado, lavado e usado novamente. Estes manuscritos eram chamados palimpsestos (do grego palin = de novo e psesto = raspado).


Um famoso manuscrito – o Códice Efraimita está escrito em um palimpsesto. Por meio de reagentes químicos e raios ultravioletas eruditos têm conseguido fazer reaparecer a escrita primitiva desses palimpsestos. Dos 250 manuscritos unciais conhecidos hoje, do Novo Testamento, 52 são palimpsestos.


Formato dos Livros


O livro, através da sua longa existência, apresentou duas formas bem distintas: o rolo e o códice.


I) Rolo
Entre o povo judeu, bem como no mundo grego-latino, os livros eram normalmente publicados em forma de um rolo feito de papiro ou pergaminho. Formava-se o rolo colocando várias folhas de papiro ou couro uma ao lado da outra. O tamanho médio de um rolo entre os gregos era de 11 metros. Alguns rolos chegaram a ter o comprimento de 30 metros. O maior rolo de papiro, conhecido, é uma crônica do rei egípcio Ramsés II, com a extensão de 40 metros, conhecido como o Papiro Harris. O comprimento médio de um rolo bíblico estava entre 9 e 11 metros. Livros longos como Reis, Crônicas e Isaías eram divididos em dois rolos. Os dois maiores livros do Novo Testamento, Lucas e Atos, cada um preencheria um rolo de mais ou menos 10 metros de comprimento.


O manuseio de um rolo era mais difícil do que o de um livro atual, porque o leitor necessitava empregar as duas mãos, uma para desenrolá-lo e a outra para enrolá-lo. Além disso, as comunidades cristãs primitivas, em breve descobriram que era difícil encontrar específicos tópicos das escrituras num rolo. Diante dessas dificuldades, o engenho humano idealizou o livro nos moldes em que o temos hoje. Estes livros em seus primórdios eram chamados códices.


II) Códices
A palavra códice vem do latim “codex”, que designava primitivamente um bloco de madeira cortado em várias folhas ou tabletes para escrever. O códice era formado de várias folhas de papiro ou pergaminho sobrepostas e costuradas. Estes códices começaram a substituir os primitivos rolos no segundo século A.D. A afirmativa de que as comunidades cristãs, começaram a usar os códices nas igrejas, para diferençar dos rolos, usados nas sinagogas, pode ser verdadeira, levando-se em conta o seguinte. Dos 476 manuscritos não cristãos descobertos no Egito, copiados no segundo século A.D., 97% estão na forma de rolo. Em contrapartida, dos 111 manuscritos bíblicos cristãos dos primeiros 4 séculos da Era Cristã, 99 estão na forma de códice.


As vantagens dos códices sobre os rolos, no caso dos manuscritos bíblicos, são evidentes pelas seguintes razões:


1) Permitia que os quatro Evangelhos, ou todas as Epístolas paulinas se achassem num livro:
2) Era bem mais fácil o manuseio do livro;
3) Adaptava-se melhor para receber a escrita de ambos os lados, baixando assim o custo do livro;
4) A procura de determinadas passagens era mais rápida.


Tipos de Escrita


Na antiguidade havia dois tipos distintos de escrita em grego:


I) O cursivo, escrita rápida, empregado em escritos não literários, tais como: cartas, pedidos, recibos. Neste tipo de escrita eram comuns as contrações e abreviações.


II) O uncial, usado mais em obras literárias, caracterizava-se por serem as letras maiores e separadas umas das outras. Assemelhar-se-iam às nossas letras maiúsculas.


Os manuscritos bíblicos apresentam estes dois tipos de escrita, porém, não nos devemos esquecer que os principais se encontram em letras unciais.


No início do século IX A.D., houve uma reforma na maneira de escrever e uma escrita com letras pequenas, chamadas minúsculas, era usada na produção de livros. Letras minúsculas, economizando tempo e material, faziam com que os livros ficassem mais baratos e pudessem ser adquiridos por maior número de pessoas.


Nos manuscritos bíblicos primitivos, normalmente, nenhum espaço era deixado entre as palavras e até o século VIII a pontuação era escassamente usada. De acordo com J. Angus em História, Doutrina e Interpretação da Bíblia, Vol, I, p. 39, somente no século VIII é que foram introduzidos nos manuscritos alguns sinais de pontuação e no século IX introduziram o ponto de interrogação e a vírgula. Sentidos distintos têm surgido, quando uma simples vírgula é mudada de lugar, como se evidencia da leitura da conhecida passagem: “Em verdade te digo hoje, comigo estarás no paraíso”.


Muitas outras passagens bíblicas podem ser lidas com sentido totalmente diferente ao ser mudada a sua pontuação como nos confirmam os seguintes exemplos: “Ressuscitou, não está aqui.” “Ressuscitou? não, está aqui.” “A voz daquele que clama no deserto: preparai o caminho do Senhor”; “A voz daquele que clama: no deserto preparai o caminho do Senhor.”


Texto de Pedro Apolinário, História do Texto Bíblico, Capítulo 8.

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